Unicamp cria grupo para estudar participação em capital de empresas: ‘Pensar no futuro’
Em meio à pandemia, universidade estadual avalia formas de se apropriar de forma mais eficiente sobre o que produz, investir em companhias-filhas e expandir autofinanciamento. Vista aérea do campus da Unicamp, em Campinas
Antonio Scarpinetti
“A crise vai passar e temos que pensar no futuro”. A afirmação em tom categórico do diretor-executivo da Agência de Inovação da Unicamp (Inova), Newton Frateschi, sintetiza a criação de um grupo de trabalho pela universidade estadual para estudar a participação dela no capital social de empresas.
A pandemia do novo coronavírus já repercutiu nos congelamentos de salários e cerca de R$ 72 milhões previstos em orçamento. Agora, a instituição de ensino avalia modelos com dois propósitos que podem implicar, por exemplo, em mais atenção aos movimentos da Bolsa de Valores e valorização do empreendedorismo realizado pela comunidade interna:
se apropriar de maneira mais eficiente sobre o que é produzido;
viabilizar e investir em companhias-filhas para gerar mais recursos para a Unicamp e impulsionar um novo formato para expandir o financiamento de novas atividades.
Frateschi preside a equipe nomeada pelo reitor, Marcelo Knobel, com a expectativa de avaliar até o fim de 2020 diferentes formatos para levar adiante a possibilidade desta proposta: seja em participação direta ou por meio de quotas ou ações das empresas, desde que a Unicamp tenha sempre uma participação minoritária.
Além disso, ele ressalta que os recursos voltados aos investimentos serão externos – nunca têm como origem o orçamento dela – e que o sentimento de “pertencimento” dos ex-alunos e docentes pode ser um diferencial para fortalecer a medida.
O professor explica ao G1 que iniciativa pode resultar em um modelo inédito entre as instituições públicas de ensino superior. Segundo ele, os referenciais são a Lei de Inovação Tecnológica, além de decretos para regulamentação publicados em 2017 e 2018, respectivamente pelo Estado e União.
“Essa questão de participação em capital de empresas é algo que existe fora do Brasil comumente, como em Cambridge […] Hoje você tem uma ideia boa, a possibilidade de criar uma empresa de inovação e tecnologia, mas não tem investidores. A universidade pode colocar dinheiro, viabilizar e depois receber mais recursos. Às vezes você cria 50, uma delas vira grande e há retorno”, conta.
O diretor-executivo da Agência de Inovação da Unicamp, Newton Frateschi
Antoninho Perri / Unicamp
Ele menciona que vislumbra inicialmente um direcionamento um modelo com foco nas empresas-filhas da Unicamp – que entre outubro de 2018 e outubro do ano passado movimentaram R$ 7,9 bilhões e somavam 31,3 mil empregos diretos. “Hoje, elas não são financiadas pela universidade”, ressalta.
Duas das companhias mais recentes criadas neste rol, segundo relatório divulgado à época pela Inova, faturam R$ 1 bilhão cada. Ao todo, 95% delas foram criadas por alunos ou ex-estudantes da universidade estadual; enquanto as demais foram desenvolvidas por docentes ou funcionários, empresas que tenham como atividade principal uma tecnologia licenciada da Unicamp, ou companhias incubadas ou graduadas pela Incubadora de Empresas de Base Tecnológica (Incamp).
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Riscos e dúvidas
Ao ponderar sobre dúvidas tratadas pelo grupo de trabalho nas discussões, como eventuais riscos, Frateschi faz uma série de considerações sobre garantias de segurança para a Unicamp e sinaliza uma estimativa de valor inicial para ações.
A primeira é a universidade nunca figurar como participante majoritária numa empresa, e o fato de que os recursos a serem aplicados na proposta devem ter como origem a criação de um fundo de investimentos, portanto, formado por recursos extraorçamentários.
Ele apresenta a expectativa de R$ 20 milhões em doações, ao lembrar que a universidade conseguiu engajamento para ser beneficiada por diversas ações voluntárias no enfrentamento à Covid-19. Além disso, deixa claro que o valor não seria usado, mas sim os rendimentos para os projetos.
“As pessoas têm ligação forte, de pertencimento, uma das coisas que temos como princípio é: gostamos da Unicamp e queremos retribuir. A ideia é fazer algo seguro, para que elas se sintam seguras […] A universidade também pode se associar a outros fundos, mas nunca será dinheiro que ela usa para manter a sua missão, ou seja, pagar os salários, fazer manutenções”, destaca.
Estudantes no campus da Unicamp, antes da pandemia da Covid-19
Antonio Scarpinetti / Unicamp
Sobre o investimento em empresas, ele avalia sob duas perspectivas. “Além de viabilizar uma empresa, a Unicamp dá um certo lastro e vira um atrativo”, afirma ao salientar o foco em modelos das companhias-filhas, e que um capital semente para investimento seria algo em torno de até R$ 50 mil.
Já sobre outros modelos de empresas, ele lembra que a proposta tem como fundamento preservar a universidade estadual.
“E se a empresa tiver dívidas, vai contaminar a Unicamp? Estamos estudando, mas não. Muitas vezes se cria uma joint venture [empresa criada a partir dos recursos de duas companhias que se unem e dividem resultados – lucros e prejuízos]. Se não der certo, você perde o dinheiro, mas não herda dívida, ou ainda pode exercer opção de compra”, ressalta Frateschi.
Além disso, ele diz que são discutidas normas sobre quem pode participar e, depois que o trabalho for concluído, será analisado pelo Consu, órgão máximo de deliberação da Unicamp. A universidade avalia também o modelo da Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa, que faz o gerenciamento administrativo e financeiro de projetos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
“Queremos terminar a proposta até o fim do ano, gostaria de fazer até mais rápido. Com reuniões virtuais está mais fácil, há tempo para criar algo bastante sólido”, afirma o diretor da Inova.
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