Setores comerciais dividem opinião sobre protocolos de reabertura da economia

Prefeitura de Salvador e Governo do Estado anunciaram uma série de medidas conjuntas para reabertura do comércio e outras atividades que estão proibidas de funcionar desde o mês de março em Salvador.

O governador  Rui Costa e e o prefeito ACM Neto deram entrevista nesta terça-feira (7) dando detalhes do plano batizado como ‘Retomada Salvador’ e que tem três etapas – todas condicionadas à ocupação dos leitos de UTI exclusivos para tratamento da Covid-19 em Salvador.

Shoppings Centers e igrejas, comércios de mais de 200 m² e drive ins serão os liberados nesta primeira etapa, que começa a vigorar quando a cidade registrar uma ocupação inferior a 75% dos leitos de UTI exclusivos para o coronavírus. Segundo o prefeito ACM Neto, a ocupação atual desses leitos em Salvador é de 79%.

Os shoppings devem funcionar de segunda a sábado, das 12h às 20h, presencial e com drive thru. Alimentação terá somente delivery e retirada, ou seja, não vai ter praça de alimentação. Há determinação para a capacidade – as áreas comuns devem ter uma pessoa a cada 9 metros quadrados. Lojas devem ter uma pessoa a cada 5 metros quadrados.

Coordenador regional para o estado da Bahia da Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce), Edson Piaggio, afirmou ao CORREIO que a entidade já havia preparado um protocolo, que recebeu o aval da equipe de infectologia do Hospital Sírio-Libanês, apontando diretrizes de funcionamento para os shoppings, que, nas palavras dele, oferece “um dos lugares mais seguros que se pode ir”.

O protocolo encomendado pela Abrasce prevê medição de temperatura de todos no shopping, orientação e informação de como se comportar no interior e fora das dependências dos estabelecimentos e limitação no fluxo de pessoas dentro dos corredores e no interior das lojas.

“Estamos seguros de que os shoppings estão preparados para receber as pessoas com toda a segurança e com todas as recomendações das autoridades sanitárias”, diz Piaggio.

O Sindicato dos Comerciários em Salvador não está tão confiante assim. Diretor Jurídico do órgão, Alfredo Santiago entende que essas medidas são insuficientes para garantir um ambiente de trabalho seguro.

“Seria mais eficaz a distribuição das máscaras e do protetor facial para trabalhadores e consumidores, dessa forma o vírus na circulará pelos shoppings (espaço fechado) e nos ônibus, permitindo uma estabilização nas taxas de ocupação dos leitos”, diz o diretor.

O sindicato alega que há relato de trabalhadores do drive thru e de comércio de calçados que foram contaminados, portanto entendem que é necessário ter protocolos e garantia de equipamentos que diminuam esse risco para quem trabalha.

“Temos uma preocupação que os pequenos lojistas não terão como arcar com esses custos, estão sem fluxo de caixa e como irão fornecer os EPI’s, do álcool em gel, higienização e da testagem de 21 em 21 dias? Essa obrigação tem que ser dos shoppings pelo menos nesses primeiros meses”, aponta Alfredo Santiago.

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A reclamação, e preocupação, com a periodicidade das testagens também é presente no depoimento de Paulo Motta, presidente do Sindicatos dos Lojistas do Estado da Bahia (Sindilojas). Mas esse não é o único incômodo.

Motta alega que o protocolo surge como uma “medida inconsistente” porque não tem uma referência clara de “de como as empresas vão poder se adequar e sobreviver às exigências” impostas pelo plano de reabertura, que classifica como um “tiro no pé”.

“Condicionado a [retornar após] uma redução de taxa, não há nem como a gente projetar e se organizar sobre quando poderemos entrar em funcionamento. Como negociar com fornecedores, comerciários sobre quando funcionar? Se você compra a mercadoria e fica indefinida a entrada em funcionamento você perde o que negociou com o fornecedor”, diz Paulo Motta.

Presidente da Fecomercio-BA, Carlos de Souza Andrade,  entende que Salvador tem infraestrutura para reabrir suas atividades da primeira fase antes dos 75% e diz que durante os próximos cinco dias vai tentar negociar com município e estado uma revisão desse número.

“Nós priorizamos a vida e valorizamos que todas as equipes do poder público estão dialogando conosco. No entanto, entendemos que Salvador tem uma capacidade de reabrir suas atividades com toda a cautela possível. Estamos há 4 meses com nossas empresas fechadas”, diz.

Ainda na primeira fase, templos e igrejas terão funcionamento de segunda a sábado, das 10h às 20h. Domingo não haverá restrição de horário. A capacidade deve ser de 20% do espaço ou 50 pessoas – o que for maior. Será preciso usar máscaras e manter afastamentos. Ficam proibidas atividades em escolas, aulas e reuniões, além de espaços para crianças.

Os estabelecimentos de rua com mais de 200m² poderão funcionar de segunda a sexta, das 10h às 16h. A operação poderá ser presencial ou com drive thru. A capacidade deve respeitar o limite de 1 pessoa a cada 9m², o estacionamento com ocupação máxima de 50% a partir de 10 vagas.

Os locais devem oferecer atendimento prioritário a pessoas dos grupos de risco, exigir uso de máscara e afastamento das pessoas. Eventos presenciais em lojas ficam proibidos.

Já drive ins só podem funcionar com autorização prévia da prefeitura. A operação só poderá acontecer dentro de veículos fechados – o serviço de alimentação deve ser dentro destes. Os carros terão distanciamento mínimo de 1,5 entre um outro.

A venda de ingressos e pagamento de alimentação será exclusivamente on-line e a empresa que for organizar deve oferecer uma vila virtual para quem quiser usar o banheiro, evitando aglomeração.
 

As decisões são técnicas, acompanham os critérios científicos. Não é a minha vontade como gestor, a vontade do governador. A nós cabe mediar”, explicou Neto.”O foco é assegurar que não haja falta de leito hospitalar para atender a todos os pacientes que precisem”. Educação, futebol profissional, praias e parques públicos, além de desmais espaços do tipo, estão sendo analisados à parte.

O governador destacou também que os leitos são a principal medida. “O parâmetro que nós vamos utilizar, e estamos utilizando para todo estado, é o da capacidade do poder público de ofertar leitos e unidades de saúde”, afirmou Rui. “O que prefeito, governador, podem fazer é garantir unidade de saúde para as pessoas serem atendidas. A partir daí é a ciência, a medicina, Deus, quem vai ajudar. O nosso parâmetro é de leitos hospitalares”, afirmou.

A retomada das atividades deve ser gradual e progressiva, em ciclos de 14 dias, para preservar a capacidade do sistema. Serão observadas orientações da Organização Mundial de Saúde (OMS) e pelos comitês da Prefeitura e Governo. Qualquer medida de flexibilização será precedida de protocolos, com adaptação de ambientes de trabalho, garantindo precaução no transporte dos trabalhadores. Todos os resultados serão monitorados para permitir reação rápida, se necessária.

O prefeito anunciou que com ajuda do governo vai aumentar em 75 leitos de UTI para covid-19 em Salvador. A prefeitura vai disponibilizar os respiradores e ajudar nos custos para instalar 25 leitos no hospital de campanha na Arena Fonte Nova.

Ele destacou também que serão disponibilizados 350 leitos clínicos para tratamento de pacientes com problemas respiratórios, e a efetividade do Salvador Protege, que rastreia o coronavírus após novas pessoas serem infectadas.

Outros parãmetros
Infectologista e professora da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Nilse Querino entende que é mesmo necessário pensar num plano de retomada da economia, mas acredita que é vago se basear apenas nos números de ocupação de leitos para definir a reabertura dos setores.

“Estamos há meses sem a economia funcionar, então chega num momento é que é mesmo preciso voltar”, adianta ela. 

No entanto, é bastante previsível e comprovado que a retomada pode elevar os números de casos de infecção. Consequentemente, esse fenômeno implica no aparecimento de casos graves da doença, que vão depender de leitos de UTI. O cenário fica ainda mais incerto quando se considera a subnotificação de casos não só na Bahia, mas em todo o país, por falta de testes de diagnóstico, aponta a médica.

“O raciocínio básico é esse: Se tenho mil leitos de UTI e 700 deles estão ocupados, significa dizer que tenho ainda 300 disponíveis. Esses 300 darão para suportar o aumento de casos? Se tenho UTIs com 80% seria uma incongruência abrir o comércio porque pessoas em estado grave poderiam não ter atendimento e mais gente pode morrer”, exemplifica.

Outras fases
A fase 2 começa quando a taxa de ocupação dos leitos de UTI chegar a menos que 70%. Quando isso acontecer, serão liberados os funciomentos de academias de ginástica e similares; barbearias e salões de beleza, centros culturais, museus e galerias de arte; lanchonete, bares e restaurantes; além da ampliação da flexibilização para todos aqueles estabelecimentos liberados na fase 1.

Presidente executivo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel-BA), Luiz Henrique do Amaral, diz que o setor está acompanhando atentamente a discussão sobre a retomada, mas defende que o entendimento sobre esse processo junto ao poder público deve se não só em basear em critérios de saúde para salvar vidas, mas garantir também a sobrevivência das empresas, já que muitas se encontram sem fluxo de caixa para a reativação.

“É um momento extremamente caótico, onde aumentou a inadimplência. Com isso, não tem recurso para pagar fornecedor, que acaba nos negativando. Sem caixa, não tem como pagar as contas de água, luz, que foram sendo cortadas. A análise precisa ser sobre o colapso da saúde, mas também um colapso das empresas, que vai depender ainda de novas formas de consumo. Achar essa equação é o desafio”, aponta Amaral.

Por fim, a fase 3 inicia quando for menor que 60%. Nela, serão liberados os funcionamentos de Cinemas, Parque de Diversão, Teatros, Parques Temáticos; Clubes sociais, recreativos e esportivos, além dos Centros de Evento e Convenções.

De acordo com a Prefeitura, para ocorrer a progressão das fases é necessário sempre que se mantenha essa taxa por cinco dias. Atualmente, a taxa de ocupação de UTIs exclusivas para covid-19 está em 79%.

*Colaborou Hilza Cordeiro