O relator da medida provisória, Marcos Rogério (na tela), durante a sessão remota desta quinta-feira
O Plenário do Senado aprovou nesta quinta-feira (17) a medida provisória que permite a desestatização da Eletrobras — MP 1.031/2021, que, devido às alterações feitas pelos parlamentares, está tramitando no Congresso sob a forma de um projeto de lei de conversão: o PLV 7/2021.
Essa medida provisória já havia sido aprovada (e modificada) pelos deputados federais. Mas como os senadores alteraram o texto que veio da Câmara, ele terá de voltar à Câmara dos Deputados para nova votação.
A MP precisa da aprovação final do Congresso até o dia 22, quando perde a validade.
Os senadores retomaram pela manhã a discussão sobre a proposta, que havia sido iniciada na quarta-feira (16). Foram cerca de nove horas de debates, no total, com a apresentação de três pareceres diferentes pelo relator, senador Marcos Rogério (DEM-RO). A disputa se refletiu no resultado final da votação: a MP recebeu 42 votos favoráveis, um a mais do que o mínimo necessário para a aprovação, e 37 contrários.
O modelo de desestatização prevê a emissão de novas ações da Eletrobras, que serão vendidas no mercado sem a participação da União, resultando na perda do controle acionário de voto mantido atualmente por ela. Cada acionista, individualmente, não poderá deter mais de 10% do capital votante da empresa. A União terá uma ação de classe especial (golden share) que lhe garante poder de veto em decisões da assembleia de acionistas.
A MP foi aprovada com dispositivos introduzidos pela Câmara dos Deputados que preveem que o governo federal patrocine, pelos próximos 15 anos, a contratação de usinas termelétricas a gás natural em regiões do interior do país onde hoje não existe esse fornecimento. O senador Marcos Rogério, porém, removeu a regra que tornava esse processo uma condição para o processo de desestatização.
Para o relator, a aprovação dessa medida provisória fortalecerá a Eletrobras e ao mesmo tempo manterá a União como um ator importante na gestão do setor elétrico. Ele afirmou que o modelo atual de controle estatal deixou estagnada a geração de energia, o que poderá ser revertido com a MP.
— A capitalização da Eletrobras devolve a ela o protagonismo no setor elétrico e a capacidade real de investimento para modernização do parque de geração e de transmissão, com foco, sobretudo, na redução do preço da energia.
A previsão de contratação das termelétricas foi criticada pelos parlamentares ao longo da semana, sendo considerada um “jabuti” (um trecho inserido no texto que não tem relação com o propósito original da MP). Marcos Rogério argumentou que a incorporação dessas usinas terá um papel importante na estabilização e no barateamento do fornecimento de energia para o interior.
— O Brasil hoje tem que despachar térmicas a diesel, muito mais poluentes e caras, além de importar energia. Ela tem um custo médio de R$ 1 mil por megawatt/hora. Manter o modelo atual, sem o incremento dessa infraestrutura, da energia termelétrica movida a gás, significa ficar como estamos. Nós precisamos de energia firme. Os parques termelétricos garantem isso.
O senador Eduardo Braga (MDB-AM), que foi ministro de Minas e Energia, também defendeu a proposta do uso das termelétricas, argumentando que o país é excessivamente dependente de hidrelétricas que vivem dificuldades para manter seus reservatórios, o que levaria a um cenário de desabastecimento ou de tarifas altas. Ele disse que a diferença entre a garantia física das hidrelétricas e a energia que efetivamente geram — o chamado risco hidrológico — hoje é custeada pelo consumidor.
— A carteira de investimento da Eletrobras hoje só tem um projeto: a usina nuclear de Angra dos Reis. Enquanto isso, nós estamos comprando e despachando energia. Os nossos reservatórios estão em crise não é de hoje. A Eletrobras voltou a dar lucro porque o povo brasileiro a indenizou para manter o pagamento do risco hidrológico — afirmou Braga.
As termelétricas deverão atender a estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste. No relatório final, Marcos Rogério acrescentou também as áreas da região Sudeste hoje atendidas pela Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e os estados sudestinos que são produtores de gás natural. Em suas últimas mudanças no texto, na manhã desta quinta, o relator também fez várias alterações nas cotas mínimas de energia das termelétricas destinadas a cada região, procurando acomodar os pedidos dos colegas.
Jean Paul Prates (PT-RN), líder da minoria no Senado, criticou essas negociações para construção do texto, que ele chamou de “barganhas” sem embasamento técnico.
— Nós estamos tratando disso como se fosse uma xepa energética. São megawatts subsidiados, que vão para a conta de luz do cidadão. Não é possível fazer isso sem estudo de impacto tarifário, sem estudo de viabilidade técnica e ambiental. Estamos falando de distorcer o planejamento energético, que é feito de forma decenal; as fontes competem pela tarifa mais baixa. Não podemos fazer a irresponsabilidade de fazer essa quermesse.
Durante o dia, os senadores contrários à MP reiteraram que ela compromete a soberania nacional, ao tirar do controle do Estado a empresa que é a maior produtora e distribuidora de energia do país. Eles também argumentam que os termos do projeto criam “oligopólios setoriais” que vão reduzir a concorrência e encarecer as tarifas de luz. Para os parlamentares que se posicionaram a favor da desestatização, a proposta deve abrir caminho para mais investimentos em infraestrutura energética e para melhor atendimento a regiões remotas do país.