Sem aula durante a pandemia? Veja dicas para ajudar no desenvolvimento das crianças em casa


‘Vamos correr atrás do conteúdo depois. Agora, o foco deve ser em manter as crianças cuidadas emocionalmente’, diz educadora. Confira sugestões de atividades por faixa etária. Bebês e crianças também podem aprender em casa, enquanto as escolas estiverem fechadas.
Divulgação/Fundação Maria Cecília Souto Vidigal
Na maior parte do Brasil, as crianças estão longe dos professores e dos amigos desde março, por causa da pandemia do novo coronavírus. Diante da possibilidade de retomar o ano letivo só em 2021, vem a preocupação: “Como ajudar meu filho a se desenvolver, mesmo fora da escola?”.
A alternativa do ensino remoto enfrenta obstáculos – crianças pequenas que não acompanham aulas virtuais, residências sem acesso à internet ou de conexão de baixa qualidade e escolas que não oferecem atividades à distância.
Antes de pensar que o ano está perdido, é preciso entender que as crianças aprendem mesmo em espaços não-escolares. “Tudo o que elas estão vivendo dentro de casa é importante”, afirma Raquel Franzim, coordenadora de educação do Instituto Alana.
“Vamos correr atrás do conteúdo depois, dá para recuperar. Agora, o foco deve ser em manter as crianças cuidadas emocionalmente, interessadas, ativas e curiosas.”

Arte/G1
Criar rotina, sim. Mas dando liberdade
Toda criança precisa de uma rotina definida. Na escola, é comum que os professores expliquem, logo no começo do dia, quais serão as atividades: quando vão brincar ou tirar uma soneca. Em casa, os pais devem seguir a mesma lógica. “Saber o que será feito pode aliviar a ansiedade delas”, diz Beatriz Abuchaim, gerente de conhecimento aplicado da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal.
Isso não significa preencher o dia inteiro com atividades organizadas pelos adultos – até porque há a rotina de trabalho e de compromissos. Dar liberdade para os filhos criarem as próprias brincadeiras também é importante para o desenvolvimento da autonomia.
Brincar com o filho é um ‘peso’?
Durante a pandemia, sabemos que os pais estão sobrecarregados – o dia é corrido, com afazeres domésticos, trabalho e crianças em casa. É possível, diante disso, não enxergar a brincadeira com os filhos como mais um peso do dia?
Veja as dicas da psicóloga Rita Calegari e de Raquel Franzim:
Monte um ambiente agradável e gostoso para todos da família.
Tente se entregar ao momento e escolha uma atividade que também lhe dê prazer. Não é só a criança que precisa gostar daquilo. “Quando minha filha era pequena, pedia para eu jogar videogame com ela. Eu explicava que não gostava disso e que poderíamos pensar em outra atividade juntas”, diz Calegari.
Priorize a qualidade, não a quantidade. Teve um dia muito cansativo? Reduza o tempo da brincadeira. É melhor ter 10 minutos com atenção integral à criança do que meia hora em que você estará olhando o celular.
Quanto mais você relaxar e aproveitar a brincadeira, mais a criança vai aprender. “Existe uma fundamentação científica: quanto melhor o clima em casa, mais autonomia os filhos desenvolvem. Eles percebem quando temos brilho nos olhos”, afirma Franzim.
Respeite-se. “Não estamos passando por um momento fácil. Explique para a criança se você não estiver em um dia bom. Diga que, amanhã, estará melhor. É importante ser honesto – nenhuma criança precisa de um super-herói como pai ou mãe”, diz Calegari.
‘O professor não pode delegar a alfabetização para as famílias’, diz Mara Mansani
E o contato com outras crianças?
Não conviver com outras crianças por tanto tempo – especialmente no caso das que não têm irmãos na mesma casa – torna o processo de aprendizagem diferente.
Em casa, é muito mais fácil se relacionar com adultos: o filho pede algo, os pais já atendem na mesma hora. O nível de frustração é menor e a atenção que as crianças recebem é mais exclusiva. Na escola, é preciso aprender a dividir o tempo do professor com todos os outros colegas, a esperar pela sua vez e a negociar com seus pares.
“Tudo isso pode ser recuperado quando voltarmos à normalidade”, expõe Abuchaim.
Pais não são professores
É claro que a família não vai conseguir substituir a escola. Mas é possível agir de maneira a estimular o desenvolvimento dos filhos e a “preparar o terreno” para a volta às aulas presenciais. Não é necessário ter formação universitária ou materiais didáticos – pais não vão desempenhar o papel exato do professor.
Franzim, do Instituto Alana, reforça a importância da proximidade entre o colégio e a família dos alunos. “As secretarias de educação e as escolas devem dar ideias de brincadeiras, sempre pensando que cada um tem uma condição”, diz.
Os pais que não sabem ler e escrever também podem ajudar as crianças: com experiências da vida prática, formas de resolver problemas, receitas tradicionais. “Manter o vínculo e a comunicação com a família evita o que mais tememos: a evasão escolar”, complementa Franzim.
Para educadora, conhecimento também vem de casa
Sugestões de atividades
Veja dicas para estimular o desenvolvimento das crianças, por faixa etária.
São ideias propostas por Raquel Franzim (Fundação Alana), Beatriz Abuchaim (Fundação Maria Cecília Souto Vidigal) e pelo projeto TempoJunto.
0 a 18 meses
Bebês precisam, sobretudo, de afeto.
Reprodução/A Cidade On São Carlos
Do que os bebês mais precisam? Do contato humano, segundo Franzim. “Trocar fralda, descansar e dar banho podem não parecer atividades educativas, mas são. Eles precisam de uma referência de cuidados e de um ambiente de afeto para se desenvolverem”, diz.
Para o bebê reconhecer emoções, faça caretas em frente ao espelho.
Brinque de “cadê?”: esconda-se e reapareça atrás de uma toalha para mostrar que uma pessoa ou um objeto existem mesmo quando estão fora do campo de visão do bebê.
Faça, por exemplo, um cachorro em um jogo de sombras na parede e o associe ao som de um latido.
Use diferentes objetos para produzir sons. Podem ser itens do dia a dia, como um pratinho de plástico ou várias chaves juntas.
Cante e leia histórias para o seu filho.
Coloque materiais diferentes, de várias cores e tamanhos, dentro de garrafas PET. Elástico de cabelo, feijões… Isso vai estimular as percepções sensoriais do bebê. Mas sempre se certifique de que a tampa esteja bem fechada.
Monte uma corrida de obstáculos, com almofadas e cobertores, para quem está engatinhando ou aprendendo a andar.
Para os que já quase não são mais bebês: esconda um objeto pela casa e crie uma caça ao tesouro.
De 18 meses a 3 anos
Criança brinca com balde.
Reprodução/Pixabay
Treine associações. Misture vários pares de sapato e, com a criança, junte os pares de novo.
Desenhe carinhas com emoções. “Vamos fazer uma menina feliz? E uma triste?”. Aproveite para conversar com a criança enquanto vocês fazem a atividade.
Organize uma brincadeira de caçar objetos de determinada cor pela casa. Vamos atrás de tudo o que é vermelho? Vale uma almofada, um casaco, uma maçã… É uma forma de estimular o movimento e a habilidade de fazer associações.
Pegue potes de diferentes tamanhos e tire as tampas. O desafio é achar quais se encaixam.
Plante um feijão em um algodão, junto com a criança, e acompanhe o crescimento da plantinha.
Use meias para fazer fantoches e criar uma história.
Brinque de ciranda e cante cantigas de roda. Vale juntar toda a família para o “marcha soldado, cabeça de papel”, “ciranda, cirandinha, vamos todos cirandar…”.
De 3 a 6 anos
Criança brinca de se esconder atrás da porta.
Reprodução/Pixabay
Nessa faixa etária, há uma necessidade maior de movimento. “Não podendo estar na escola, ter interação com os amigos ou brincar no parque, a casa é o lugar onde a criança poderá se mexer”, diz Franzim.
É importante também estimular a pesquisa e a resolução de problemas – buscar respostas em livros, na internet ou até em uma ligação para um parente. Há desafios no nosso dia a dia: na hora de cozinhar, que tal pensar em como aumentar a receita?
Ensine brincadeiras de mão – “Pararapati” ou “adoleta” fazem sucesso.
Escolha uma foto de revista e recorte-a em partes, para montar um quebra-cabeça.
Junte todo mundo da casa, estique um cobertor e peça para cada um segurar uma ponta do tecido. Só colocar uma bexiga ou uma bola e brincar de jogá-la pra cima, usando o pano. Não pode deixar cair!
Organize um esconde-esconde ou um pequeno circuito de corrida.
Conte histórias a partir de fotos da família. Estimule a curiosidade da criança.
Faça uma sessão de fotos bem criativa, usando objetos da casa e roupas dos adultos.
Brinque de amarelinha ou de passa-anel.
Monte uma cabana com o que tiver em casa: colchão, cobertor, almofadas…
Ouçam música e dancem – dá para criar coreografias bem diferentes.
Encha uma balde ou bacia com água e jogue tampinhas de garrafa PET nela. Com uma peneira, brinquem de pescaria.
De 6 a 7 anos: alfabetização
Criança escreve, a lápis, em papel.
Reprodução/Pixabay
É natural ficar aflito na fase da alfabetização. Mas não é necessário tentar ensinar o próprio filho a ler e a escrever – o importante é sempre estimular a prática social da linguagem e despertar o interesse por essas habilidades.
Como? Trazendo o uso da língua portuguesa para atividades significativas para a família, diz Raquel Franzim.
Leia uma receita, uma embalagem de brinquedo, um livro infantil.
Crie situações para a escrita, mesmo que seja do jeito da criança. Ela pode rabiscar uma lista de compras, por exemplo.
Se souber, escreva na frente dela: pode ser um bilhete para alguém, uma cartinha para a avó. “É o ponto de partida para a alfabetização”, afirma Franzim.
Faça comparações entre palavras: “Olhe só, o ‘Lu’ de ‘Lúcia’ é o mesmo ‘Lu’ de ‘lua’”.
Initial plugin text