Reforma administrativa alimenta impasse entre bancadas e enfrenta primeiro obstáculo na Câmara
SÃO PAULO – Uma semana após ser finalmente apresentada pelo governo Jair Bolsonaro, a proposta da reforma administrativa já enfrenta seus primeiros desafios antes mesmo de começar a tramitar no Congresso Nacional.
Este foi um dos assuntos do podcast Frequência Política. programa é uma parceria entre o InfoMoney e a XP Investimentos. Ouça a íntegra pelo player acima.
A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) cria linhas gerais para questões do funcionalismo público que serão detalhadas em etapas seguintes por pacotes de projetos de lei ordinária e complementar.
Entre os pontos tratados, estão a definição de cinco tipos de vínculo entre servidores e o Estado, sendo que apenas um deles garante a estabilidade. A proposta também pretende diminuir a quantidade de carreiras de modo a evitar distorções e acabar com determinados benefícios, como férias superiores a 30 dias e aposentadoria compulsória como punição.
O texto vale para servidores dos Três Poderes, mas não contempla parlamentares, juízes, desembargadores, ministros de tribunais superiores, promotores, procuradores e militares. Apenas quem ingressar no setor público a partir da promulgação da emenda constitucional será afetado. Para os atuais servidores, nada muda.
Prometida há um ano, a proposta só foi encaminhada após pressão de atores políticos, sobretudo do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Agora, tem tropeçado nas dificuldades de retomada dos trabalhos das comissões.
Regimentalmente, a PEC precisa iniciar sua tramitação na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), onde é feita análise de constitucionalidade. Na sequência, o texto segue para comissão especial, colegiado que se debruça sobre o mérito. Por fim, segue para o plenário, onde é necessário apoio mínimo de 3/5 (308 deputados) em dois turnos.
No Senado Federal, a proposta precisa passar pela CCJ e pelo plenário, onde também precisa de pelo menos 3/5 dos votos (ou seja, 49) em dois turnos. Caso não haja alterações em relação à versão encaminhada pelos deputados, segue para promulgação pelo parlamento. Se houver modificação não apenas de redação, volta obrigatoriamente para a casa onde começou a tramitar. A alteração em uma casa exige nova apreciação da outra, sucessivamente.
Desde a definição de trabalhos remotos nas duas casas em função da pandemia de Covid-19, as comissões permanentes tiveram suas atividades suspensas e o plenário centralizou a atuação parlamentar. Neste ano legislativo, as comissões sequer chegaram a ser instaladas.
Agora, os deputados tentam chegar a um acordo para finalmente iniciar os trabalhos nos colegiados e permitir que matérias como a reforma administrativa tramitem. Mas sobram arestas. Há divergências sobre quais comissões deveriam retomar os trabalhos e como seria a distribuição das presidências e posições entre as bancadas.
A votação de projeto de resolução que autorizava a retomada do funcionamento de comissões constava como primeiro item da pauta de sessão deliberativa extraordinária do plenário da Câmara dos Deputados na última quarta-feira (9). Contudo, foi adiada pelos parlamentares por falta de acordo.
Deputados questionam alguns pontos no texto que seria apreciado. Um deles seria a percepção de que a atual redação poderia ampliar poderes aos presidentes das comissões. Outro seria uma preocupação de opositores de que Rodrigo Maia possa autorizar o funcionamento de outros colegiados, permanentes ou temporários, após consulta aos líderes partidários. Isso poderia, em tese, abrir caminho para a instalação de comissão especial para debater a reforma administrativa depois do exame de admissibilidade na CCJ.
“A oposição está resistindo à reabertura de algumas comissões, claramente com o intuito de atrasar a tramitação da reforma administrativa. Por outro lado, também há a divisão de cargos das comissões entre os partidos”, observa a analista política Júnia Gama, da XP Investimentos.
“Quem for eleito agora vai ter dois meses. Como fica? O partido que tinha o ‘direito adquirido’ de presidir a CCJ vai jogar fora e presidir só dois meses?”, questiona Paulo Gama, também da XP Política. “Sabemos que mandato-tampão é um trampolim para ficar mais um tempo. Não é simples juntar essas engrenagens e fazê-las girar”, pontua.
Antes mesmo da pandemia, a presidência da CCJ era objeto de disputa entre algumas das principais bancadas da casa. A comissão era comandada pelo deputado Felipe Francischini (PSL-PR), mas os pesselistas perderam força diante do racha com o presidente Jair Bolsonaro. Desde então, vem sendo cobiçada por outros partidos, como MDB, Republicanos e PDT.
A bola agora está com Rodrigo Maia, que terá de costurar os acordos necessários para a retomada dos trabalhos. O presidente da casa gostaria de avançar com a proposta ainda este ano, como uma espécie de legado da gestão. A pauta cheia, o calendário curto e a contaminação com as eleições municipais, porém, lançam mais obstáculos.
O assunto foi abordado na edição desta semana do podcast Frequência Política. Você pode ouvir a íntegra pelo Spotify, Spreaker, iTunes, Google Podcasts e Castbox ou baixar o episódio clicando aqui.
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