Reconhecimento Facial em São Paulo: Polêmica, Contratos Milionários e Questões sobre Transparência
Em meio a controvérsias e questionamentos judiciais, a prefeitura de São Paulo assinou, recentemente, um contrato de R$ 588 milhões para instalar 20 mil câmeras de reconhecimento facial nas ruas da cidade. Esse projeto, que gerou fortes reações da sociedade e especialistas em privacidade, promete ser um dos maiores da América Latina, mas levanta importantes discussões sobre segurança, privacidade e transparência.
A empresa vencedora do contrato, o Consórcio Smart City SP, composto pela CLD Construtora (antiga Consladel), Flama Serviços, Camerite Sistemas, e PK9 Tecnologia, gerou preocupação devido ao histórico de denúncias de corrupção da líder do consórcio, CLD Construtora. O processo de escolha da empresa foi cercado de mistério: apesar de ter ficado em terceiro lugar, o consórcio foi anunciado vencedor, enquanto o nome dos participantes foi mantido em segredo por meses. A primeira colocada, L8 Group, foi desclassificada por razões técnicas, e a segunda, Line Service, desistiu da disputa.
A questão ganhou ainda mais atenção pela posição da prefeitura em relação à privacidade dos cidadãos. Muitos especialistas criticam o projeto, alegando que os sistemas de reconhecimento facial ainda são pouco eficazes para segurança pública e representam uma ameaça à privacidade individual. Vanessa Koetz, da organização Coding Rights, aponta que tais tecnologias, sem um debate público transparente e uma estrutura robusta de governança de dados, podem intensificar a vigilância indiscriminada e os preconceitos, transformando áreas monitoradas em espaços de segregação social.
O contexto jurídico do projeto também é denso: em janeiro deste ano, o Ministério Público abriu uma investigação sobre as possíveis irregularidades do edital, e em abril, a contratação foi temporariamente suspensa após ação movida pela Bancada Feminista na Câmara de Vereadores, mas a decisão foi revertida dias depois.
Os riscos de adoção de um sistema como o Smart Sampa são evidentes. Cidades como San Francisco, nos Estados Unidos, optaram por proibir o reconhecimento facial devido às dificuldades de controle e os potenciais abusos. No Brasil, cidades como Salvador e Rio de Janeiro já implementaram a tecnologia, mas os dados sobre sua eficácia são escassos, limitando a avaliação de sua real contribuição para a segurança.
Enquanto o contrato segue em execução e as discussões sobre os riscos e a viabilidade da tecnologia avançam, é crucial que a sociedade acompanhe de perto o impacto desse projeto nas ruas de São Paulo. A implementação de uma tecnologia tão invasiva, especialmente sob condições de licitação questionáveis e sigilo empresarial, aponta para a importância de se exigir transparência e responsabilização de cada etapa do processo.