Professor da UFV participa de trabalho inédito sobre preservação da biodiversidade aquática
O trabalho reúne grande quantidade de dados sobre peixes e invertebrados de ambientes de água doce distribuídos em biomas da América do Sul. O Parque Nacional do Caparaó foi uma das áreas analisadas pelo professor da UFV
UFV/Divulgação
O professor da Universidade Federal de Viçosa (UFV), Frederico Falcão Salles, participou de um trabalho inédito sobre o efeito da degradação da vegetação ripária (ribeirinha) sobre a biodiversidade aquática na região conhecida como Neotropical.
Além do professor do Departamento de Entomologia da UFV, o estudo contou com pesquisadores de outras 25 instituições. O trabalho reúne grande quantidade de dados sobre peixes e invertebrados de ambientes de água doce distribuídos em biomas da América do Sul.
O estudo resultou no artigo “Thresholds of freshwater biodiversity in response to riparian vegetation loss in the Neotropical region” publicado, no mês passado, no periódico Journal of Applied Ecology.
De acordo com a UFV, o pesquisador da instituição contribuiu com um trabalho com o grupo de insetos Ephemeroptera, que vive a sua fase imatura (chamada ninfa ou larva) em ambientes de água doce e está entre os organismos mais sensíveis às alterações ambientais.
“Dentro da enorme quantidade de dados que levantamos sobre a fauna deste grupo no Brasil, uma era muito relevante para este estudo, visto que envolvia não apenas a coleta sistematizada de ninfas de Ephemeroptera ao longo de todo o estado do Espírito Santo, mas também a sua identificação até o nível de espécie, o que é raro em trabalhos envolvendo insetos imaturos”, destacou Falcão Salles.
Os insetos Ephemeroptera são frequentemente utilizados em pesquisas que pretendem avaliar ou monitorar a qualidade da água em todo o mundo. Os dados levantados abrangeram informações sobre a distribuição e a abundância de 81 espécies de Ephemeroptera, provenientes de quase 50 pontos de coleta.
Eles integram a dissertação de mestrado de Fabiana C. Massariol, que é também co-autora do artigo e foi supervisionada por Frederico, quando ele ainda lecionava na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).
Resultado do Estudo
No artigo “Thresholds of freshwater biodiversity in response to riparian vegetation loss in the Neotropical region”, os autores analisam, dentro da estratégia de tentar proteger os ecossistemas aquáticos com a adoção de faixas de vegetação nativa no entorno de riachos, rios e lagos, as seguintes questões:
Quanto se deve proteger para prevenir colapsos da biodiversidade aquática?
Há um tamanho único a ser usado para estabelecer regulamentos em grandes regiões ou continentes?
É possível reduzir o risco de se aproximar desses colapsos?
Para chegar às respostas a essas perguntas, 50 pesquisadores realizaram anos de trabalho, coletando, identificando e organizando dados sobre os ecossistemas aquáticos do Brasil, com a utilização de imagens de satélite para detectar mudanças no entorno dos riachos.
O professor Frederico Salles foi um dos responsáveis pela coleta de dados relacionados ao bioma Mata Atlântica. Além do bioma analisado pelo pesquisador da UFV, o estudo contou com a análise dos biomas Amazônia, Pampa e Cerrado.
De acordo com o primeiro autor do artigo e pesquisador da Universidade Federal de Goiás (UFG), Renato B. Dala-Corte, o trabalho em conjunto possibilitou que, pela primeira vez, questões envolvendo o efeito da degradação ripária sobre a biodiversidade aquática fossem investigadas com uma grande quantidade de dados, para distintos biomas.
“Nós já sabíamos, com base em outros estudos, que proteger a vegetação ripária é a chave para manter os ecossistemas de água doce saudáveis e para proteger a biodiversidade. O que nós não sabíamos é se existiam padrões consistentes ao longo de grandes regiões e se nós poderíamos recomendar um tamanho único de reserva ripária que maximizasse a proteção da biodiversidade ao mesmo tempo que permitisse a adoção das práticas comuns de uso do solo no restante da paisagem”, afirmou.
Os resultados desse trabalho amplo indicam que não existe um valor único de largura de vegetação ripária para garantir que os ecossistemas aquáticos não sofram mudanças abruptas de biodiversidade devido às pressões de uso do solo, uma vez que a variação entre biomas e tamanhos ripários avaliados foi muito elevada.
A constatação acaba tendo implicações diretas sobre o manejo de reservas ripárias, conhecidas no Brasil como Áreas de Preservação Permanente (APPs), que seguem um único tamanho para limitar o uso do solo em escala nacional, sem levar em consideração as particularidades regionais ou o tipo de atividade antrópica de cada região.
Outra descoberta do estudo diz respeito ao tamanho mínimo das reservas ripárias. No Brasil, a Lei Ambiental 12.651/2012 determina a proteção de APPs de 30 metros de largura no entorno de riachos pequenos, tanto para propriedades privadas quanto públicas.
Contudo, o estudo sugere que qualquer alteração na área de 50 metros no entorno dos riachos já é suficiente para desencadear grandes mudanças na biodiversidade aquática, ou seja, 30 metros é menor do que o mínimo necessário para reduzir o risco de ultrapassar os limiares de perda de biodiversidade.
Diante dos resultados obtidos a partir do estudo, FalcãoSalles e os autores esperam que “os resultados obtidos extrapolem o ambiente acadêmico e que sirvam de subsídio para os tomadores de decisão”.
O trabalho é fruto de uma iniciativa abrangente do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), que busca aumentar a colaboração dos pesquisadores brasileiros em distintas áreas. A iniciativa conta com financiamento dos governos federal (CNPq) e estadual de Goiás (Fapeg).