Pequenas delicadezas que fazem a diferença

A ordem é ficar em casa, o máximo possível. Até quando será assim, não sabemos. Depois do susto e recolhimento, começamos a responder também com afeto, solidariedade, apoio em diversos níveis. Quando esse momento passar, teremos construído memórias profundas. Lembraremos de tudo. Do que sentimos, do que oferecemos e também do que recebemos nesse tempo ensina sobre novas conexões com desconhecidos, parentes, amigos/as, vizinhos. Cada um/a dá o que tem: tempo, dinheiro, informação, escuta, receita de bolo, música, livros… e sempre há quem precise. Nessa hora de trocas intensas, pequenas delicadezas são grandes gestos. Tudo importa, quando quase todo mundo tá se sentindo sozinho.

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O psicanalista Luiz Mena está no grupo Los Papas: gestos amáveis entre homens (Foto: Divulgação)

Homens, receitas e vídeos

O grupo nasceu em 2015, quando pais (apenas pais, não mães) de alunos de uma mesma escola de Salvador passaram a se reunir entre eles, com a presença dos/as filhos/as, pra cozinhar, tocar, viajar, interagir. Cinco anos depois, o “Los Papas” conta com pais de várias escolas da cidade e se reinventa agora, nesses primeiros dias de isolamento social. “Resolvemos resistir e não perder a humanidade. Um dia, dividi uma receita e postei foto do prato que ofereci à minha família. No mesmo dia, outros pais ofereceram músicas e postaram vídeos para a gente, com canções no violão”, comenta o professor Murilo Nuno, sobre a inauguração desse tempo de novas delicadezas. Entre os que oferecem canções ao violão, o psicanalista Luiz Mena lembra um outro aspecto dessa interação que deixa mais leves os dias de confinamento: “Gestos amáveis entre homens, algo pouco comum nesse mundo machista nosso, né?”.

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Clarissa Almeida: grupo no Whatsapp com dicas de terapia floral (Foto: divulgação)

Remédios para a alma

Foi pensando em aliviar o peso desses dias que a fisioterapeuta Clarissa Almeida disponibilizou o conhecimento adquirido em uma de suas especializações. Ela, que também é terapeuta floral, formou um grupo de terapeutas da mesma linha, no Whatsapp (71 9 9231 7560), para atender gratuitamente. “A ideia surgiu depois de três dias de confinamento, quando meu namorado, Marcelo Stehling, achou que poderíamos ajudar as pessoas mais sensíveis, mesmo à distância, uma vez que nossos consultórios estão fechados”. Desde então, a demanda é enorme: “são pessoas que, além dos florais, precisam conversar, interagir e desabafar, mesmo não sendo esse o foco”, explica.

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Clara Braz: vídeos e textos no Instagram com dicas de Ioga (foto: divulgação)

Ioga para manter o equilíbrio

A instrutora de ioga, meditação e respiração Clara Braz foi pela mesma linha: cuidar. Ela também sabe que é preciso calibrar o equilíbrio, enquanto caminhamos nessa corda bamba. Por isso, decidiu oferecer as técnicas que conhece, de graça. “Tenho feito vídeos e textos no meu Instagram com conhecimento da Ioga, para ajudar as pessoas no enfrentamento desse momento de dificuldade, com mais consciência e tranquilidade. Vou fazer também lives com meditações guiadas. Além disso, me coloquei à disposição de todos/as que quiserem conversar e tirar dúvidas no @clarabrazyoga”.

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Priscila Lolata: biblioteca para espantar o tédio no condomínio onde mora (Foto: divulgação)

Livros à mancheia

Desde quando as aulas na UFBA foram suspensas, a professora universitária Priscila Lolata está em isolamento com o filho de 17 anos. Um dia, interfonou para o porteiro, procurando saber como estavam as coisas. As medidas de segurança estavam ok, mas com a drástica diminuição do movimento no prédio de 81 apartamentos de três quartos, um novo inimigo surgiu: o tédio. Cansados das notícias sobre a pandemia, os funcionários também haviam desligado a tevê e se sentiam sozinhos. “Fui logo procurar uns livros bem diversificados e deixei sete na portaria, disponibilizando, também, para todos os outros funcionários. Me disponibilizei também para trocar, repor e discutir (pelo interfone) sobre os livros. Não é só quem está confinado que pode sentir tédio, fiquemos atentos! Sempre interfono para saber como eles estão e se estão gostando da leitura. Daqui a uns dias, vou ver se querem outros, sentir mais qual a preferência deles”, diz Priscila que pretende criar um “clube do livro”, no condomínio, assim que a pandemia passar.

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O cabelereiro Luciando Macedo recebeu um crédito de um cliente (Foto: divulgação)

Mais do que cliente, amigo

Luciano Macedo, nesse caso, está do outro lado da linha. Há uns dias, foi a vez de o cabeleireiro, conhecido pela solidariedade, se emocionar com a delicadeza de um cliente que, ao saber do fechamento temporário do salão, encontrou um jeito de dizer “estamos juntos nessa”: “recebi uma mensagem de um cliente, o Henrique, que corta cabelo comigo há quase a dez anos. Depois, ele trouxe a noiva para fazer cabelo e hoje somos muito amigos. Ele veio todo carinhoso e preocupado, querendo saber como eu estava com esses dias parado, aí se ofereceu pra pagar uns cortes de cabelos antecipados, pagar luzes da esposa, mesmo que ela só venha fazer em junho. Vi que era um sinal de Deus para que eu não desanimasse e chorei de emoção”, explica Luciano, provando, mais uma vez, que tudo que vai… vem.
 

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