Os papéis do Prefeito

Não quero referir-me aqui aos volumosos maços de processos que ainda hoje atulham as mesas dos gestores públicos de todos os níveis em nosso país, herança das ordenações portuguesas de que ainda não conseguimos nos livrar, continuando a produzir leis – e até Constituição – tão minudentes e detalhadas que emperram a ação pública. Neste ano de eleições municipais, refiro-me especificamente às funções administrativas do prefeito enquanto chefe do Poder Executivo Municipal.
Não raro muitos gestores públicos, especialmente nos municípios de menor porte econômico e demográfico – que são a imensa maioria – imaginam que administrar a Prefeitura é o seu principal papel. Sem dúvida isto é essencial, fundamental, necessário e indispensável, mas está longe de ser o suficiente. É óbvio que a Prefeitura precisa ser gerida com eficiência, responsabilidade, transparência e foco na racionalização dos custos. Mas cuidar apenas da Prefeitura é ficar somente olhando para o próprio umbigo. É preciso entender que a Prefeitura é tão somente um ente administrativo para a gestão dos serviços sociais, da cidade e do território, o que permite entregar resultados à sociedade.
Administrar bem a Prefeitura é obrigação, mas é provavelmente o menos importante dos papéis do prefeito. O risco é perder-se, cuidando da Prefeitura – que é meio – e deixar de corresponder aos imensos e urgentes anseios da sociedade. Para correspondê-los, essencial é cuidar do ambiente urbano – a cidade – e do rural – o território –, além dos serviços sociais – a Educação e a Saúde.
A cidade é, por excelência, o principal tema municipal. Não é sem razão que as prefeituras são obrigadas a elaborar – e periodicamente atualizar – diversos planos, como PDDU, PLAMOB, PMSB, todos urbanos. Tanto mais agora, quando as cidades vêm assumindo protagonismo crescente nos modernos processos de desenvolvimento. Esta é uma exigência e uma oportunidade. O que o prefeito for capaz de fazer pela sua cidade será a conquista que a sua comunidade terá; o padrão de urbanização adotado será determinante para a qualidade de vida da população, o que pressupõe sustentabilidade econômica, social, ambiental e físico-territorial.
É preciso usar o urbanismo como instrumento de transformação, para gerar mais desenvolvimento e promover melhor qualidade de vida. As cidades não podem continuar sendo desenhadas para o automóvel, mas sim para servir às pessoas; projetos viários devem ceder espaço para parques e praças; o transporte público se impõe ante o individual; resiliência passou a ser um atributo indispensável; cidades compactas, com uso misto, proporcionam menores custos de manutenção e operação; projetos estratégicos com forte impacto e poder transformador são mais importantes do que os investimentos incrementais de sempre, que reproduzem mais do mesmo.
O território precisa ser visto pelo seu potencial e muitas vezes é a principal base econômica de um município. Basta ver a importância nacional do agronegócio. Assim, definidos os perímetros urbanos da sede, vilas e povoados, é preciso ter um olhar diferenciado para a vasta área municipal remanescente, geralmente descuidada. Impõe-se um mínimo de atenção ao seu ordenamento, como a proteção das áreas de nascentes e cursos d’água, da cobertura vegetal, do patrimônio ambiental em suma. O meio ambiente costuma também apresentar potencial turístico, mas o fundamental é, sobretudo, garantir a segurança hídrica. É essencial fortalecer a base produtiva local – geralmente agropecuária – derivando sempre que possível para a agroindústria.
E convém ter as vistas voltadas para o contexto regional em que o município está inserido, para tirar daí todo o proveito possível para um desenvolvimento econômico comum. A regra é explorar todas as possibilidades do desenvolvimento local, na cidade e no campo, visando a geração de oportunidades de trabalho e renda para a população. Esta é a missão a ser cumprida!
Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional.