Médico cardiologista acusado de abuso sexual de pacientes em consultório é preso em Presidente Prudente
Justiça recebeu a denúncia apresentada pelo Ministério Público Estadual e Augusto César Barretto Filho, de 74 anos, se tornou réu.
A Polícia Civil prendeu na tarde desta sexta-feira (18) o médico cardiologista Augusto César Barretto Filho, de 74 anos, acusado de abusar sexualmente de pacientes mulheres em seu consultório em Presidente Prudente. Ele teve a prisão preventiva decretada pela Justiça após ser denunciado pelo Ministério Público Estadual (MPE).
Juntamente com seu advogado de defesa, Barretto Filho apresentou-se espontaneamente à Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), em Presidente Prudente, onde a Polícia Civil deu cumprimento ao mandado de prisão expedido pela Justiça.
Na delegacia, ele foi submetido ao exame de corpo de delito, realizado por um médico legista, e depois foi transferido à Penitenciária de Lucélia, para onde são levados os presos envolvidos em crimes sexuais.
O advogado de defesa, Emerson Longhi, afirmou que a prisão preventiva “é totalmente desnecessária” porque o cardiologista compareceu a todos os atos a que foi convocado pela Polícia Civil e está afastado de suas funções médicas.
Longhi adiantou que a defesa estuda as medidas judiciais cabíveis para tentar derrubar a prisão preventiva de seu cliente, como um habeas corpus ou um pedido de revogação da medida que levou Barretto Filho à cadeia.
Além de decretar a prisão preventiva do médico, o juiz da 2ª Vara Criminal da Comarca de Presidente Prudente, João Pedro Bressane de Paula Barbosa, recebeu nesta quinta-feira (17) a denúncia apresentada pelo MPE contra Barretto Filho, que se tornou réu.
Na Delegacia de Defesa da Mulher, em Presidente Prudente, já foram registrados 37 relatos de abuso sexual de mulheres contra Barretto Filho.
Na denúncia, o promotor de Justiça Filipe Teixeira Antunes acusa o médico de cometer o crime de violação sexual mediante fraude, previsto no artigo 215 do Código Penal, com pena de reclusão de dois a seis anos, agravado pela conduta tipificada no artigo 61, inciso II, alínea g, que trata do abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão.
O caso tramita em sigilo no Fórum da Comarca de Presidente Prudente.
Antunes explicou ao G1 que o pedido de prisão preventiva do médico foi feito à Justiça como forma de garantia da ordem pública, já que no entendimento do MPE existe o risco de ele voltar a praticar os delitos contra pacientes.
Segundo o promotor de Justiça, as investigações realizadas pela Delegacia de Defesa da Mulher, em Presidente Prudente, foram iniciadas em julho de 2018, a partir do relato de uma vítima.
“Ele acariciava as partes íntimas das vítimas durante o atendimento médico dentro de seu consultório para a sua satisfação sexual. Essas carícias não tinham nenhuma relação com o atendimento médico. Ele abusava da confiança das vítimas. Ele tocava as partes sexuais das vítimas e esfregava o seu pênis nas mulheres”, descreveu o promotor de Justiça ao G1.
Em depoimento à Polícia Civil, segundo o MPE, o médico negou os fatos e disse que vai se manifestar em juízo.
As mulheres identificadas como vítimas tinham entre 18 e 50 anos quando foram abusadas, segundo o MPE.
Na avaliação de Antunes, como existe a possibilidade de outras mulheres terem sido vítimas do cardiologista, a orientação é para que procurem a DDM para que os casos sejam apurados.
‘Estado de choque’
Ao detalhar o caso que deu origem às investigações, em julho de 2018, a Polícia Civil relatou que o médico acariciou “de forma lasciva” a perna e a virilha da paciente, assim como introduziu a mão no interior de sua calcinha, apalpando a vagina da mulher, durante o atendimento no consultório. Além disso, segundo a polícia, o cardiologista colocou a mão da vítima em seu pênis, enquanto aferia sua pressão arterial.
“Não bastasse, o médico ainda pediu para ela virar de costas para auscultar seu coração e efetuou movimentos contínuos semelhantes aos utilizados na prática de conjunção anal, encostando seu quadril na região das nádegas da vítima”, salientou a polícia.
A vítima explicou que havia passado por consulta com o mesmo profissional em maio do ano passado e naquela ocasião o atendimento transcorrera dentro da normalidade. Sua pressão arterial foi aferida com a mulher sentada, assim como pela secretária, e a paciente ainda realizou um exame de eletrocardiograma.
Como lhe foram solicitados outros exames, a mulher retornou ao médico em nova consulta no dia 19 de julho de 2018, oportunidade em que o abuso sexual ocorreu.
Durante o abuso, a vítima repetiu por duas vezes, segundo a Polícia Civil, que não gostava daquele comportamento, mas o médico “fitou os olhos de maneira firme e prosseguiu”.
A paciente descreveu que entrou em “estado de choque”, passou a chorar, mas não conseguiu gritar por socorro. A mulher ficou sem reação, exceto a de pedir ao médico diversas vezes para parar.
Interdição cautelar
Nesta sexta-feira (18), o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) informou que, diante do volume de casos denunciados envolvendo o cardiologista Augusto César Barretto Filho e “dado o seu potencial de lesividade social”, aprovou a interdição cautelar suspendendo o seu registro profissional.
A suspensão é válida por seis meses, podendo ser renovada por igual período.
O Cremesp comunicará a decisão a todos os demais Conselhos Regionais de Medicina do país, impedindo, assim, seu registro em outra jurisdição.
O Cremesp esclareceu ainda que, mesmo com a interdição cautelar, a sindicância em curso contra o médico seguirá normalmente, sob sigilo determinado por lei.
A apuração está a cargo da Câmara Técnica de Assédio Sexual, criada para investigar esses tipos de casos.
O Cremesp apontou que as novas denúncias contra o cardiologista serão juntadas à investigação em curso.
Registros
A Delegacia de Defesa da Mulher, em Presidente Prudente, já contabiliza o registro de 37 mulheres que alegam terem sido vítimas de abuso sexual cometido pelo cardiologista durante atendimento em seu consultório.
Em todos os casos registrados na Polícia Civil, os relatos apontam que as vítimas foram atacadas quando passavam por atendimento médico no consultório do cardiologista, em Presidente Prudente, ao longo dos últimos 25 anos.
‘Piada’
Uma das mulheres que registraram Boletim de Ocorrência na DDM, relatando terem sido abusadas sexualmente pelo cardiologista, disse ao G1 que amigos e conhecidos fizeram “piada” quando souberam do caso dela.
“A gente vê que o machismo está em todo lugar. Até em casos como este. Quando, na época, eu disse que havia sido abusada pelo médico, disseram que eu teria gostado. Quando afirmei que viria até a delegacia denunciar, hoje, falaram: ‘Se ficou tanto tempo sem denunciar, é porque gostou’”, afirmou Simoni Aparecida de Oliveira, de 32 anos, que mora em Tarabai.
Ela disse ter sido abusada pelo profissional no consultório médico dele em 2014.
Empoderamento
A delegada Adriana Pavarina, responsável pelas investigações, afirmou que a prisão do cardiologista representa o “empoderamento” para as vítimas denunciarem novos casos de abuso sexual.
“Ressaltamos que as mulheres se fortaleçam com a prisão do autor para se empoderar a denunciar novos casos”, disse ela em entrevista coletiva na DDM na tarde desta sexta-feira (18).
“Ressaltamos ainda que o inquérito que deu início foi concluído no mais absoluto respeito aos direitos e garantias individuais, tanto das vítimas como também do investigado. Nosso inquérito policial foi concluído e remetido à Justiça e somente a imprensa tomou ciência após o oferecimento da denúncia”, complementou a delegada.
“Portanto, nós convidamos e empoderamos as novas vítimas a comparecer, pois da mesma forma como transcorreu esse primeiro inquérito policial a identidade e a preservação de todos os direitos e garantias individuais tanto das vítimas como do investigado serão mantidas sob sigilo”, enfatizou.
“Uma prisão preventiva para ser decretada precisa satisfazer todos os requisitos exigidos pelo Código de Processo Penal, que dentre eles são tanto os motivos ensejadores da prisão preventiva como a presença de indícios suficientes de autoria e materialidade. Essa análise é feita pelo Poder Judiciário, mas para que ele fundamente uma decisão nesse sentido precisa encontrar presentes no inquérito policial que foi realizado indícios suficientes de autoria e materialidade e fundamentar na garantia da ordem pública”, frisou a delegada.
“A prisão fortalece o empoderamento das vítimas para que elas consigam, superando essa dificuldade do medo, da vergonha e da humilhação, que são próprios de todas as vítimas de crimes sexuais, se empoderar para denunciar, fortalecidas ainda com a certeza de que o fato não será impune”, afirmou Adriana Pavarina.
“Juridicamente, todas essas mulheres descrevendo um comportamento semelhante, para a legislação penal, isso caracteriza uma fonte de prova, que é um indício. Portanto, são utilizadas como fonte de prova e corroboram a investigação e a instrução processual para futura condenação”, concluiu a delegada.