Marido é fator de risco, vamos falar a verdade

Quase todo dia agradeço por estar solteira, nesse isolamento. Não, eu não quero mais morar com homem nenhum, por melhor que ele seja, muito menos numa situação de convívio 24/7. Deus é mais. Mesmo sentindo falta das “participações especiais” (temporariamente suspensas), estar em carreira solo, isolada com meu filho, é todo o conforto emocional que eu poderia desejar, nessa travessia incerta que não sabemos como nem quando vai acabar.
Mas há sinais: depois da Gripe Espanhola – que matou cerca de 40 milhões de pessoas em todo o mundo – o Rio de Janeiro (onde morreram mais de 14 mil) teve um dos Carnavais mais eróticos, libertários e animados da sua história. Isso em 1919. Portanto, já tenho uma meta e quero avisar que estarei viva e pronta para pular o próximo, em Salvador, por mais que ele demore a chegar. Por esse Carnaval, por meu filho, por meus amigos e amigas, por minha família e por muitos outros motivos, pretendo demais sair viva dessa agonia. Para que isso aconteça, precisamos, principalmente, de duas coisas: higiene impecável e equilíbrio emocional, além de todas as necessidades básicas. Diante do que concluo que ter um marido, neste momento, é puro atraso de vida, na maioria dos casos.
A conclusão nem é só minha, digo logo. E nem fui a primeira, no meu grupo de amigas, a falar sobre a dificuldade de encontrar alguma paz quando se precisa explicar protocolos avançados de higiene a pessoas que nem sequer aprenderam a dar descarga com a tampa do vaso fechada. Ou a sentar pra fazer xixi. Ou a lavar o pinto direito, em casos mais graves. Eu, solteiríssima, não tenho do que reclamar, nesse aspecto, mas tenho ouvido desabafos de mulheres que não aguentam mais seus homens heteros tradicionais.
Demanda pura. Eles querem sair, eles acham que é só uma “gripezinha”, eles não dividem as tarefas domésticas, eles acham que mulheres exageram nos cuidados, ele levou a filha pequena ao banco lotado (caso real), ele quer receber a visita da mãe que trabalha em laboratório (outro caso real), ele quer vir de São Paulo para a Bahia encontrar a esposa e os filhos pequenos, mesmo estando “gripado” (mais realidade). Ele está entediado. Só ele, o alecrim dourado que nasceu no campo sem ser semeado.
Há situações mais graves, eu sei. Mas antes que os sommeliers de militância (amei o termo, Salvatore!) me perguntem “mas e sobre mulheres que estão confinadas com seus espancadores, você não vai falar?” ou “você tem que falar das pessoas que estão desabrigadas” digo logo: já falei e falarei, mas hoje, não. Neste fim de tarde, enquanto aguardo a entrega das cervejas que vou beber sozinha e em paz, direciono meus melhores pensamentos para as mulheres que estão limpando, cozinhando, fazendo home office, homeschooling e lidando com esses fatores de risco encarnados. Respiremos juntas. Por ora, calma. Daqui a pouco ele volta pro trabalho, as crianças voltam a ter aulas, a vida vai voltando ao “normal”. Só não esqueça de anotar cada desgosto desses dias porque, como sabemos, os cartórios também vão reabrir e, claro, aquele Carnaval vai chegar.