Governo da Argentina intervém em principal empresa exportadora de soja do país


Segundo presidente Alberto Fenández, medida busca “resgatar” a companhia, que é uma das maiores processadoras de soja do mundo e que está em recuperação judicial desde fevereiro. Caminhões descarregam soja em unidade de processamento na região do porto de Rosario, Argentina
REUTERS/Nicolás Misculin
O governo de Argentina publicou um decreto nesta terça-feira (9) que permite a intervenção estatal na processadora de soja Vicentin, principal exportadora de óleo e farelo do país, em um primeiro passo para a expropriação da companhia.
O presidente Alberto Fernández anunciou na segunda-feira (8) a intervenção na companhia e sinalizou que enviará ao Congresso um projeto de lei para expropriar a empresa.
A Vicentin está em recuperação judicial desde fevereiro, e o plano de Fernández é “resgatar” a empresa. Segundo ele, o principal objetivo é preservar empregos e proteger o setor exportador do país.
A Argentina espera que seu projeto de intervenção possibilite obter uma maior fluidez no ingresso de divisas de que o país tanto necessita, mas a iniciativa pode afetar sua relação com os mercados.
O país vizinho é o principal exportador mundial de ambos os derivados de soja (óleo e farelo), e em 2019 obteve receita de US$ 12,25 bilhões com as vendas dos produtos. A Vicentin pediu recuperação judicial em fevereiro, depois de entrar em “default” no final de 2019 (leia mais abaixo).
A presença de uma empresa estatal no setor agroexportador “pode dar mais previsibilidade ao mercado de câmbio na oferta de dólares, e evitar esses movimentos tão disruptivos que tivemos na história. É mais uma ferramenta”, disse o ministro do Desenvolvimento Produtivo argentino, Matías Kulfas, à Rádio Con Vos.
Incerteza
O anúncio da intervenção gerou surpresa no setor, bem como incerteza nos mercados. O Citi publicou em relatório que acredita que “a decisão das autoridades sem dúvidas afetará a percepção sobre a simpatia do país em relação às empresas privadas.”
A câmara de empresas agroexportadoras e processadoras da Argentina, CIARA-CEC, expressou que “é importante que a futura estatal siga as mesmas regras do jogo e tenha as mesmas condições que as demais empresas”, embora tenha acrescentado que buscará articulação junto à companhia.
O analista independente Guillermo Mouliá disse que, além do choque gerado pela notícia, a Vicentin provavelmente não operará no mercado de grãos até que sua situação possa ser resolvida, apenas na temporada 2020/21.
Vicentin
A Argentina é a maior exportadora de farelo de soja do mundo e a Vicentin uma das principais empresas fabricantes do produto no país.
Fundada em 1929, a companhia chegou a ser a maior exportadora de soja processada da Argentina, além de carregar uma marca icônica no mercado doméstico de alimentos.
A Vicentin deu calote (“default”) em empréstimos bancários e fornecedores no início deste ano, antes mesmo de a terceira maior economia da América Latina começar a sofrer os efeitos da pandemia de coronavírus.
A companhia possui uma joint venture com a Glencore chamada Renova, que é proprietária de uma grande unidade de processamento de soja na província de Santa Fe. A Renova permaneceu operacional durante o tumulto dos últimos meses.
Fernández disse que não consultou a Glencore antes de decidir intervir na Vicentin. Ele classificou a medida como uma “decisão estratégica para a economia nacional”.