Governança nova no saneamento – do esgoto ao adubo

Quando o Secretário-Geral da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Angel Gurría, durante o 8º Fórum Mundial da Água (2018), em Brasília, firmou pacto para implementação dos Princípios da OCDE sobre Governança da Água, incluindo os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Agenda 2030; estabeleceu princípios do marco regulatório durante o maior evento global do setor, que reuniu governos do mundo, academia, gestores públicos e privados entre os cerca de 30 mil participantes, além da mídia internacional.

Dimensionando e ajudando a solucionar o problema. Em 1900 cerca de 150 milhões de pessoas moravam em cidades do mundo. Em 2000, eram 2,8 bilhões. Hoje, mais de 65% da população da Terra vive amontoada em cidades onde novas soluções do bem-estar hídrico precisam ser adotadas. O Water Governance Initiative (WGI-OCDE) oferece metodologias a serem utilizadas em nível de país, região, bacia e cidade para melhorar as políticas, com um sistema de indicadores para priorizar etapas, essenciais para o crescimento sustentado. [bit.do/OCDE-Agua]

Atribuindo a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) competência para editar normas de referência na área, o marco regulatório do saneamento [Lei 14.026, de 15/07/2020] impõe governanças e investimentos novos para solucionar um urgente problema ambiental que gera graves problemas sociais.

Com cerca de 85% da população urbana brasileira concentrada em cidades que cobrem apenas 0,63% do território nacional, a previsão de investimento total é de R$ 753 bilhões, até 2033. Segundo a Associação das Concessionárias Privadas (Abcon), desse montante, R$ 144 bilhões são previstos para a rede de água, R$ 354 bilhões para a rede de esgoto e R$ 255 bilhões para a troca de redes antigas, todos a serem aplicados dentro dos princípios da sustentabilidade de resultados, com prazos, tarefas, orçamentos e entregas definidos – e devidamente divulgados.

Dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) mostram que, em média apenas 46% dos esgotos do país são tratados, informando percentuais por região: Norte, 22%; Nordeste, 36%; Sudeste, 50%; Sul, 45% e Centro Oeste, 54%. Das 100 maiores cidades brasileiras que fazem tratamento do esgoto, apenas 10 tratam acima de 80% do que é coletado. Mais de 100 milhões de brasileiros não têm acesso a coleta de esgoto e 35 milhões de pessoas ainda não têm acesso a água potável.

O Instituto Trata Brasil, uma referência nacional, mantém um “esgotômetro” no site mostrando que desde janeiro de 2020, até o momento que este artigo é escrito, foram despejadas 1.515.898 piscinas olímpicas de esgoto na natureza [bit.do/esgotometro]. As Parcerias Público Privadas (PPP) unem competências para o aproveitamento das “piscinas desperdiçadas”, ajudando a transformar esgoto em adubo, na urgência exigida pela sociedade.

Analisando as oportunidades contidas na nova lei para a geração de rendas e trabalhos novos, na cidade e no campo, inclusive na agricultura familiar, startups orientam empresas em novas rotas para buscar financiamentos em bancos como o BNDES [bit.do/BNDES-Saneamento] e a Caixa Econômica Federal [bit.do/CAIXA-Saneamento], que investem no saneamento básico do país.

Levantamento da Black Rock, maior gestora de ativos do mundo, com US$ 7 trilhões sob gestão, aponta que 94% dos produtos de investimento ESG (Environment, Social and Governance) tiveram as melhores performances este ano. Estruturando o sistema, o Global Reporting Initiative (GRI), organização internacional, ajuda instituições a compreender e comunicar o impacto dos negócios nas questões de sustentabilidade, auxiliando na elaboração de relatórios para avaliação de riscos em tomadas de decisões.

As agências de risco Moody’s, Standard & Poor’s e Fitch, que avaliam e validam ativos, ficaram mais sistemáticas na avaliação dos quesitos de sustentabilidade, desde 2015, quando a ONU lançou os ODS, munindo instituições públicas e privadas com uma plataforma de ferramentas gerenciais que facilitam suas operações dentro de novos parâmetros da sustentabilidade.

Minerando ativos no esgoto, a exemplo de nitrogênio e fósforo para reciclar na cadeia produtiva, startups, que podem estar em qualquer lugar do planeta, inclusive nas pequenas cidades brasileiras sem saneamento básico, agregam inteligência nova ao sistema. Usando métricas da sustentabilidade de resultados as ‘watertechs’, atuando em rede, buscam musculaturas financeiras em aceleradoras abastecidas por fundos ligados aos Princípios para Investimentos Sustentáveis [unpri.org].

Mergulhando nos bionegócios do ambiente molhado, startups econometrizam valores de cada gota d’agua (em ml³), monitoradas via internet das coisas (IoT) e contratualizadas em blockchain, transformando esgoto em adubos baratos para abastecer a agricultura e voltar limpa, reciclada e potável, ao copo.

* Eduardo Athayde é diretor do WWI no Brasil

Conteúdo integrante do projeto de Infraestrutura Hídrica e Saneamento. Uma realização do Jornal Correio com o apoio institucional da Embasa, Secretaria de Infraestrutura Hídrica e Saneamento, WWI e o apoio da FIEB e Abapa.


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