Dois casos de reinfecção por coronavírus são confirmados no Nordeste

Um estudo coordenado pelo médico pernambucano Carlos Brito, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), traz evidências de reinfecção pelo novo coronavírus em dois médicos (uma mulher e um homem) que atuam na linha de frente de combate à doença em Recife.

Intitulado Segundo episódio de covid-19 em profissionais de saúde: relato de dois casos (em tradução livre), o trabalho foi publicado nesta quinta-feira (1º), na revista científica International Medical Case Reports Journal, e documenta casos, pela primeira vez no Recife, de segundo quadro do novo coronavírus com resultados positivos de RT-PCR (teste que faz a detecção direta do vírus em secreção respiratória e é o padrão-ouro para diagnóstico da infecção aguda).

O primeiro caso é um homem de 40 anos que apresentou febre e sintomas respiratórios no dia 10 de abril, com teste RT-PCR positivo e melhora completa dos sintomas em cinco dias. Após 44 dias, ele apresentou os mesmos sinais, além de anosmia (perda do olfato) e disgeusia (paladar alterado). Dois dias depois, ele foi submetido ao teste de RT-PCR, que novamente detectou o novo coronavírus.

O outro caso relatado no estudo é de uma mulher de 44 anos com atuação em uma unidade de referência para covid-19 no Recife. Ela teve início dos sintomas sugestivos da doença em 30 de abril, com teste de RT-PCR positivo. O quadro melhorou em seis dias. Mas em 24 de maio, ela apresentou febre, tosse e dor de garganta acompanhada de dor de cabeça, fadiga, dor muscular e diarreia. Além disso, nesse segundo episódio, a médica teve anosmia e disgeusia. Ela fez um novo teste RT-PCR, que detectou o novo coronavírus.

“O estudo permite confirmar que um segundo episódio de infecção pelo novo coronavírus não é usual, mas esse achado é importante do ponto de vista epidemiológico porque as pessoas que já tiveram covid-19 podem se achar protegidas e relaxar diante dos cuidados de prevenção, expondo-se sem medidas de proteção ao vírus”, destaca Carlos Brito.

Para ele, se esses casos fossem frequentes, certamente saltariam bastante aos olhos. O médico salienta que os dois casos de segunda infecção têm como importante diferencial, em comparação a outros trabalhos semelhantes no Brasil e em outros países, o fato de os pacientes apresentarem sintomas em ambas situações que testaram positivo para covid-19. “E no segundo episódio, as manifestações clínicas foram ainda mais específicas para a doença, com a presença de anosmia e disgeusia.”

O médico explica que as evidências de reinfecção pelo novo coronavírus são fortes nos dois casos analisados. Ele conta que o homem, após a primeira infecção detectada pelo RT-PCR, submeteu-se também ao teste sorológico (verifica a resposta imunológica em relação ao vírus), que deu negativo. “Isso sugere que o paciente não produziu anticorpos, na primeira infecção, para evitar a segunda. E só após essa, a sorologia foi positiva”, afirma.

A mulher também passou pelo teste sorológico, que detectou presença de anticorpos. “Certamente eles não foram o suficiente para eliminar o vírus e, assim, evitar a segunda infecção. A partir desse caso, reforçamos que o fato de ter anticorpos não garante que o indivíduo está completamente protegido contra o coronavírus, que pode ter sofrido alterações. Outra situação é que o título de anticorpos pode cair após a doença”, acredita Carlos Brito. O médico acrescenta que o sequenciamento do vírus, em momentos distintos de sintomas nos pacientes, é capaz de contribuir para reforçar a hipótese de reinfecção, a fim de fazer diferenciação entre casos de reativação de infecção anterior e casos de reinfecção, o que pode ser feito em estudos futuros que investiguem essa possibilidade. A reportagem do Jornal do Commercio, parceiro do CORREIO pela Rede Nordeste, entrou em contato com a assessoria de comunicação da Secretaria de Saúde de Pernambuco (SES) e foi informada que, neste momento, não vai se pronunciar sobre o estudo.

No fim de agosto, pesquisadores da Universidade de Hong Kong relataram o caso de um homem com diferentes cepas de covid-19, em amostras coletadas com intervalo de quatro a cinco meses, o que assegurou que eventos de reinfecção são possíveis. O homem estava assintomático no segundo momento em que testou positivo para o novo coronavírus.

Em setembro, o Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos (CDC) atualizou informativo que fala de informações limitadas sobre reinfecções. “Os dados, até o momento, mostram que uma pessoa que teve covid-19 e se recuperou pode ter baixos níveis de vírus por até três meses. Ela pode continuar a ter um resultado positivo, mesmo sem disseminar a doença. Não há relatos confirmados, por enquanto, de pessoa reinfectada dentro de três meses do quadro inicial. No entanto, pesquisas adicionais estão em andamento”, destaca o CDC.

*Matéria originalmente publicada no Jornal do Commercio, parceiro do CORREIO pela Rede Nordeste