Coronavírus: Subnotificação deve levar Brasil a emendar ondas da doença
O Brasil ultrapassou a marca de 1 milhão de casos confirmados da Covid-19 nesta sexta-feira, 19, de acordo com dados do Ministério da Saúde. Um outro número preocupante se aproxima: os 50 mil mortos oficiais em decorrência da doença. Estudos ainda indicam que esses dados são maiores: já seriam, pelo menos, entre 8 milhões e 10 milhões de pessoas que contraíram o novo coronavírus, segundo levantamentos da Fiocruz e da Universidade Federal de Pelotas, no Rio Grande do Sul. Oficialmente, conforme dados divulgados pelo Ministério da Saúde nesta noite, são 1.032.913 infecções de Covid-19 no Brasil e 48.954 mortos. Os estados mais afetados são: São Paulo, Rio de Janeiro, Ceará, Pará e Maranhão.
“Se hoje atingimos 1 milhão de casos, podemos extrapolar para algo próximo de 10 milhões. É uma cidade de São Paulo inteira contaminada. É um problema crônico”, afirma Paulo Henrique de Oliveira, mestre em Ciências e Tecnologias de Saúde e membro técnico da Sociedade Brasileira para a Qualidade do Cuidado e Segurança do Paciente (Sobrasp). Para ele, isso acontece, principalmente, porque o Brasil não tem uma cultura de notificação. “A disparidade ocorre porque não testamos. E, sem teste, não tem como ter estimativa. O trabalho precisa de número e informações consistentes”, completa.
O país perdeu o controle por uma somatória de problemas: atraso na identificação da gravidade da doença e na implementação de ações de contingenciamento, que fizeram com que medidas mais eficazes fossem desacreditadas – além da população, em geral, ter sido pouco sensibilizada. Segundo Oliveira, as principais medidas para combater o vírus envolviam justamente essa mobilização das pessoas, somada a testagem em massa e ampla disponibilidade de leitos. “Foram essas situações que foram impactadas e resultaram nesse aumento exponencial dos casos. Quando começamos a implementar medidas mais assertivas, tivemos um pouco de resultado. Mas o estímulo à flexibilização e a retomada econômica colocou uma semente na cabeça das pessoas que elas poderiam sair de casa.”
Problemas parecidos foram vistos em países que também têm dimensões continentais. “Nos Estados Unidos, aconteceu a mesma coisa. Entretanto, o presidente Donald Trump baixou o orgulho quando viu que a situação fugiu do controle, como o que aconteceu um Nova York. Com a flexibilização precipitada, vamos ficar mais três ou quatro meses com esses números altíssimos.” No caso do Brasil, seria o equivalente a “emendar” a primeira e a segunda onda.
Especialistas também defendem uma explicação mais técnica, que envolve justamente a dimensão territorial dos países. Logo, países maiores naturalmente estão propensos a ter maior número de casos. Para o professor da Escola de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), José Rocha Faria Neto, o crescimento da curva se dá de maneira mais homogênea em países menores. “Em nações com dimensão continental, como Brasil, Rússia e Estados Unidos, a evolução é totalmente distinta. Se você olha as curvas dos estados brasileiros, parece que você está olhando situações de países diferentes. Alguns tiveram desempenho ruim, como Itália e Reino Unido, e outros tiveram controle da situação. O grande problema é que nós ainda não atingimos o pico da curva em todos os lugares.”
Faria Neto reforçou que o Estado de São Paulo, em específico, já demonstra certa estabilidade. “Existe uma pequena variação diária, mas estamos mais ou menos estáveis. Tudo indica que já se encontra no chamado platô. O problema é que esse pico é duradouro, provavelmente, passaremos semanas assim.” Infelizmente, não dá para saber até quando isso vai.