Bacurau lidera indicações do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro 2020

Bacurau, de Kléber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, lidera a lista dos filmes finalistas do 19º Grande Prêmio do Cinema Brasileiro.
O filme recebeu 15 indicações e é seguido por A Vida Invisível, de Karim Aïnouz, com 14, e Simonal, de Leonardo Domingues, com dez indicações.
Promovido pela Academia Brasileira de Cinema e Artes Audiovisuais, o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro 2020 vai ocorrer no próximo dia 10 de outubro, em cerimônia transmitida pela TV Cultura. Ao final do anúncio da premiação, os vencedores recebem o Troféu Grande Otelo em casa.
- Confira a lista completa de indicados:
MELHOR LONGA-METRAGEM FICÇÃO
A Vida Invisível
Bacurau
Divino Amor
Hebe – A Estrela do Brasil
Simonal
MELHOR LONGA-METRAGEM DOCUMENTÁRIO
Alma Imoral
Amazônia Groove
Bixa Travesty
Estou me Guardando para o Carnaval Chegar
O Barato de Iacanga
MELHOR LONGA-METRAGEM COMÉDIA
Cine Holliúdy – A Chibata Sideral
De Pernas pro Ar 3
Eu Sou Mais Eu
Maria do Caritó
Minha Mãe É uma Peça 3
Socorro, Virei uma Garota!
MELHOR LONGA-METRAGEM ANIMAÇÃO
A Cidade dos Piratas
A Princesa de Elymia
Tito e os Pássaros
MELHOR LONGA-METRAGEM INFANTIL
Cinderela Pop
Sobre Rodas
Turma da Mônica – Laços
MELHOR DIREÇÃO
Daniel Rezende (Turma da Mônica – Laços)
Flavia Castro (Deslembro)
Gabriel Mascaro (Divino Amor)
Karim Aïnouz (A Vida Invisível)
Kléber Mendonça Filho e Juliano Dornelles (Bacurau)
MELHOR PRIMEIRA DIREÇÃO DE LONGA-METRAGEM
Alexandre Moratto (Sócrates)
Armando Praça (Greta)
Claudia Castro (Ela Disse, Ele Disse)
Dennison Ramalho (Morto Não Fala)
Leonardo Domingues (Simonal)
MELHOR ATRIZ
Andrea Beltrão (Hebe – A Estrela do Brasil)
Bárbara Colen (Bacurau)
Carol Duarte (A Vida Invisível)
Dira Paes (Divino Amor)
Julia Stockler (A Vida Invisível)
MELHOR ATOR
Daniel de Oliveira (Morto Não Fala)
Fabrício Boliveira (Simonal)
Gregório Duvivier (A Vida Invisível)
Marco Nanini (Greta)
Silvero Pereira (Bacurau)
MELHOR ATRIZ COADJUVANTE
Alli Willow (Bacurau).
Bárbara Santos (A Vida Invisível)
Fernanda Montenegro (A Vida Invisível)
Karine Teles (Bacurau)
Sônia Braga (Bacurau)
MELHOR ATOR COADJUVANTE
Antonio Saboia (Bacurau)
Caco Ciocler (Simonal)
Chico Diaz (Cine Holliúdy – A Chibata Sideral)
Flávio Bauraqui (A Vida Invisível)
Júlio Machado (Divino Amor)
MELHOR DIREÇÃO DE FOTOGRAFIA
A Turma da Mônica – Laços
A Sombra do Pai
A Vida Invisível
Deslembro
Kardec
Bacurau
MELHOR ROTEIRO ORIGINAL
Los Silencios
Hebe – A Estrela do Brasil
Deslembro
Divino Amor
Bacurau
MELHOR ROTEIRO ADAPTADO
Greta
Minha Fama de Mau
Carcereiros – O Filme
A Vida Invisível
Alma Imoral
Turma da Mônica – Laços
MELHOR DIREÇÃO DE ARTE
Turma da Mônica – Laços
Kardec
A Vida Invisível
Bacurau
Simonal
MELHOR FIGURINO
Hebe – a Estrela do Brasil
Kardec
Simonal
A Vida Invisível
Bacurau
MELHOR MAQUIAGEM
Kardec
Morto Não Fala
Simonal
A Vida Invisível
Hebe – a Estrela do Brasil
Bacurau
MELHOR EFEITO VISUAL
Kardec
Morto Não Fala
Carcereiros – O Filme
Turma da Mônica – Laços
Bacurau
MELHOR MONTAGEM FICÇÃO
Bacurau
A Vida Invisível
Greta
Turma da Mônica – Laços
Simonal
MELHOR MONTAGEM DOCUMENTÁRIO
Amazônia Groove
Torre das Donzelas
Fevereiros
Meu Amigo Fela
Estou me Guardando para Quando o Carnaval Chegar
Bixa Travesty
MELHOR SOM
Turma da Mônica – Laços
A Vida Invisível
Simonal
Bacurau
MELHOR TRILHA SONORA
O Juízo
A Vida Invisível
Bixa Travesty
Bacurau
Simonal
MELHOR LONGA-METRAGEM INTERNACIONAL
Cafarnaum
Coringa
Dor e Glória
Era uma Vez em… Hollywood
Parasita
MELHOR LONGA-METRAGEM IBERO-AMERICANO
A Odisseia dos Tontos
As Filhas do Fogo
Família Submersa
O Tradutor
Vermelho Sol
MELHOR CURTA-METRAGEM ANIMAÇÃO
Apneia, de Carol Sakura e Walkir Fernandes
Céu da Boca, de Amanda Treze
Poética de Barro, de Giuliana Danza
Ressureição, de Otto Guerra
Só Sei que Foi Assim, de Giovanna Muzel
MELHOR CURTA-METRAGEM DOCUMENTÁRIO
Amnésia, de Susanna Lira
Extratos, de Sinai Sganzerla
Fartura, de Yasmin Thayná
OLhos D’Água (Tuã Ingugu), de Daniela Thomas
Viva Alfredinho, de Roberto Berliner
MELHOR CURTA-METRAGEM FICÇÃO
Alfazema, de Sabrina Fidalgo
Angela, de Marília Nogueira
Baile, de Cíntia Domit Bittar
Rã, de Ana Flavia Cavalcanti e Julia Zakia
Sem Asas, de Renata Martins
MELHOR SÉRIE ANIMAÇÃO TV PAGA/ OTT
Bobolândia Monstrolândia
Charlie, o Entrevistador de Coisas
Lupita no Planeta de Gente Grande
Turma da Mônica Jovem
Zuzubalândia
MELHOR SÉRIE DOCUMENTÁRIO TV PAGA/ OTT
#OFuturoÉFeminino
1968 – O Despertar
Bandidos na TV
Diálogo sobre o Cinema
Quebrando o Tabu
MELHOR SÉRIE FICÇÃO TV PAGA/ OTT
Aruanas
Coisa Mais Linda
Detetives do Prédio Azul (DPA)
Sessão de Terapia
Sintonia
MELHOR SÉRIE FICÇÃO TV ABERTA
Carcereiros
Cine Holliúdy
Elis – Viver É Melhor que Sonhar
Segunda Chamada
Sob Pressão
Na última segunda-feira (24), o lançamento de Bacurau completou um ano. Os diretores conversaram com o Jornal do Commercio sobre a data.
“Quando o filme chega no Brasil, a questão da cultura, da língua e da identidade torna tudo mais intenso. Bacurau traz relações de mundo, conflitos que o ligam com o mundo. Mas é um filme brasileiro, que se passa no Nordeste, que ainda se passa no sertão do Nordeste e em cada círculo desse, ele vai se apresentando mais forte. São muitos elementos de Brasil ali que o público capta e sente no coração, algo que aumenta no Nordeste”, elabora Kleber.
Para Dornelles, essa reverberação que o filme teve por aqui era um sentimento novo, mas já prevendo um impacto diferenciado que viria, levando em conta o que aborda Bacurau e como ele faz isso, como suas articulações com o cinema de gênero. “Era o terceiro filme de Kleber, ele já tinha essa sensação, mas particularmente pra mim, era tudo muito novo. Mas acaba que ele se comunica muito forte com quem tem uma sensibilidade social, um filme sobre pessoas desassistidas e que sofrem essas negligências históricas. No Nordeste então, isso é algo que está muito à flor da pele. Acabou que as exibições por aqui se tornaram algo muito raro e único, me sinto sortudo de ter vivido isso, em sessões como as do Recife e de Fortaleza, que o cinema parecia vir abaixo”, relembra Juliano.
Não que lá fora a recepção tenha sido morna. Em setembro, Bacurau estampava a capa da francesa Cahiers du Cinéma, talvez a mais prestigiada revista de cinema do mundo. Na edição, já se apontava as articulações políticas e estilísticas do filme, que entrou na lista dos dez melhores filmes do ano feita pela publicação. Mas teve também quem se apegasse mais aos aspectos formais do filme, com suas aproximações ao western, o terror e o dito cinema b. Nos Estados Unidos, ambos os diretores tinham uma curiosidade em saber como seria visto Bacurau, levando em conta o núcleo de vilões estadunidenses.
Kleber relata que houve quem achasse caricato e lembra de um episódio no Festival de Cinema da Nova York. Na hora das perguntas, um senhor idoso pega o microfone e diz ter gostado do filme, mas indaga “eu só fiquei sem entender uma coisa: por que os americanos são malvados?”, ouvindo um “por que não?” como resposta, que arrancou risos da platéia e do próprio questionador. “É uma pergunta que vem mais de 100 anos de uma cultura de cinema onde os Estados Unidos manda as ordens, com sua força inescapável de indústria, de fazer e vender filmes. É um Duro de Matar com inimigos alemães que nem falam alemão de fato ou russos, mexicanos e estrangeiro como vilões em qualquer filme comercial. Uma das coisas que acho foda em Bacurau é como ele fez os americanos sentirem isso com essas observações”, afirma Kleber.
Por aqui, levando em conta tudo o que o filme carrega de político e a polarização política do país, notaram também que esse olhar mais voltado para o que Kleber chama de “a carpintaria do filme” acabou chamando a atenção de uma forma semelhante entre diferentes espectros de posicionamento ideológico, mesmo com uma certa relutância. O cineasta vê Bacurau furando uma bolha que não conseguiu com Aquarius (2016), incluindo a adesão de uma parcela jovem do público, que se formou vendo filmes americanos e se viu surpreso com um filme brasileiro dentro dos temas ao quais já vinha sendo apresentados.
Dornelles também vê um quadro parecido na chegada do filme para pessoas de diferentes lugares e posicionamentos políticos. “Tem muitas pessoas de direita, conservadores, que gostaram do filme. Há diferenças de maneiras de ver o filme que diferem do lugar de onde vêm. O que chama atenção no filme chama igual pra todo mundo. Mas pessoas que tem uma posição mais conservadora, posso até chamar de reacionária e de direita, se incomodaram do filme, isso em qualquer lugar em que ele foi visto. É engraçado porque tem algumas menções ao comportamento entre sudeste e nordeste no filme, alguns se ofendem, mas a maioria se vê no espelho e vê um debate importante. Há pessoas que acham que o filme é uma arma de propaganda do comunismo, uma visão esquizofrênica”, comenta Juliano.
Mas talvez aqueles que tiveram maior impacto pelo que é visto em Bacurau sejam os próprios moradores de Bacurau, ou melhor, de Barra, povoado potiguar do Sertão do Seridó onde o filme foi rodado. Segundo Juliano, há uma via de mão dupla de pertencimento, com “as pessoas de lá se sentindo pertencidas ao filme e o filme sendo pertencido a elas”. Ele diz que conhecia histórias de produções grandes que passam por cidades pequenas e mais se assemelham a uma “praga de gafanhotos”, mesmo que injetando algum dinheiro. Houve conversas com a equipe levando a preocupação para isso não acontecer, levando a uma relação de respeito e carinho com os moradores do local. Ainda há contato até hoje entre a equipe e os ilustres anfitriões, que receberam uma das primeiras exibições do filme.
Mas, mesmo com um certo impacto positivo na comunidade, Kleber chama atenção a uma série de dificuldades e descasos por quais passa a localidade. “Do ponto de vista público, não vejo tantas melhorias para a comunidade. O ambulatório do filme, por exemplo, é ficção, não existe lá. A cidade referência para eles é Parelhas, que fica a 50 minutos em estradas não tão bem cuidadas, apesar de um esforço da Prefeitura em melhorar o acesso. Eles mantiveram algumas coisas do filme, é curioso a produção altera a comunidade. Ainda recebem gente curiosa para conhecer, mas não sei se virou uma fonte de renda”, diz Kleber.
Cinema nacional
E por falar em política públicas, o caminho de Bacurau se desenrola enquanto há uma série de ataques na esfera cultural. Ele estreia pouco depois do presidente Jair Bolsonaro falar em acabar com a Agência Nacional de Cinema (Ancine) caso não pudesse colocar um filtro lá, em um momento no qual a Agência já vivia momentos turbulentos desde gestões anteriores, praticamente paralisada. Já em uma espécie de segunda onda do filme, com sua estreia em reaberturas de cinema de países como Holanda e Taiwan, depois de uma jornada nos Estados Unidos que precisou ser interrompida com a pandemia, temos o risco que corre a Cinemateca Brasileira em uma tumultuada disputa envolvendo a Secretaria de Cultura.
“Bacurau já expunha a irrealidade dessa situação do Brasil, o quão absurda é a situação política e social que enfrentamos nesse momento, em especial com a saúde e a cultura. Não que os resultados devam ser medidos em relação à mercado, mas o filme mostra o impacto da cultura na sociedade e economia, geramos cerca 800 empregos, podendo chegar a 2000, além de devolver em múltiplas vezes o investimento feito com dinheiro público. Querem acabar com o sistema de estímulo baseado numa fantasia ideológica, a mesma coisa que acontece na saúde com uma pandemia histórica. O cinema brasileiro está sendo cortado em seu momento mais feliz e produtivo, em relação não só a mercado, mas em diversidade, qualidade e quantidade de filmes feitos”, afirma o diretor.
As perspectivas em relação a uma continuidade de produção, sobretudo a pernambucana, tem suas doses de otimismo na visão da dupla. Juliano ressalta que “ser artista é ter vocação para a teimosia”. “Temos mais de uma geração diversa cineastas e artistas talentosos, com sua própria voz e identidade. Essas pessoas não vão simplesmente desaparecer, mesmo que tentem fazer isso, não tem dinheiro no mundo que pague e apague. Se pensarmos em tamanho em um sentido de orçamento, talvez demore para termos algo como foi Bacurau. Mas em termos artísticos, não tenho dúvidas de que vão aparecer vários outros de grande impacto, com liberdade, desejo e honestidade”, afirma.
Kleber vê como imperativo o setor político no âmbito estadual e municipal se articular na luta pela preservação da cultura que é feita aqui. “O Governo de Pernambuco precisa mostrar uma movimentação completamente oposta ao está acontecendo fora do estado, não só essa gestão de Paulo Câmara, mas como a próxima que vier. Somos um dos estados mais fortes do ponto de vista da expressão artística e cultural. Precisamos também nos juntar enquanto classe. Temos uma oportunidade, por exemplo, na reinauguração do Teatro do Parque, de nos juntarmos para saber o que será feito com ele, o que a Prefeitura pensa enquanto política para ele e quem são as pessoas que tomarão decisões lá. É preciso catalisar a cultura e fortalecer a efervescência”, relata Kleber.
O Teatro do Parque e seu processo de restauração faz parte de um dos próximos projetos de Kleber, descrito como um filme-ensaio que se debruça pela arqueologia do centro do Recife, em especial as salas de cinema, partindo de um amor por um Recife que ainda está ali, mas escondido por debaixo de outra cidade. Já Juliano vem conversando com produtores e mirabolando ideias e roteiros, além de estar no processo de finalização de um filme rodado antes de Bacurau, mas sem maiores detalhes revelados. Dornelles também fala da possibilidade de um retorno à Bacurau. “Por desejo popular e pessoal, eu e Kleber consideramos a possibilidade de escrevermos juntos de novo uma espécie de segundo Bacurau. Não sei se dá pra chamar de sequência ou um prequel, mas discutimos isso de forma tranquila”, afirma.