Ainda sobre maritacas, najas e emas
Há alguns dias, aqui na Bahia, houve a veiculação na imprensa jornalística, televisiva, digital ou impressa, de imagens, matérias e entrevistas acerca da suposta “invasão” das maritacas (Eupsittula aurea), também conhecidas como periquito-rei ou jandaia-estrela, no município de Ilhéus, sul do nosso estado, mais precisamente na Avenida Soares Lopes, no centro da cidade. Elas buscavam se abrigar ou serem acolhidas em postes ou redes de proteção, instaladas em moradias de tipologia predial, pois o seu local de dormida, as árvores da espécie amendoeira ou amendoeira-da-praia (Terminalia catappa), haviam sido cortadas em cerca de oito indivíduos na referida avenida. Isto foi o suficiente para as maritacas se reposicionarem, ao final do dia, na busca de poleiro para a dormida. Os moradores, contrários ao corte das árvores, ainda tentaram ajudar as aves caídas, algumas já mortas, por conta do estresse e mesmo disputa por dormida com outros indivíduos da mesma espécie, de acordo com uma colega bióloga, que foi entrevistada.
É sabido que as árvores representam um verdadeiro refúgio da fauna. Elas também proveem às aves (arborícolas ou terrícolas) com alimento, proteção e dormida. Elas são associadas, por vezes, ao acolhimento e até mesmo a deidades: a Gaia (na mitologia grega) ou a Pachamama (na cosmovisão dos povos indígenas andinos). De todo modo, as árvores cumprem um papel ecossistêmico relevante no espaço urbano, comprovado em estudos, no que se refere à influência no microclima, trazendo amenidade térmica e, em formação de estratos diferentes, servindo de barreira sonora, só para mencionar algumas funções. Animais e plantas são interdependentes e, por isso, quaisquer intervenções antrópicas precisam ser bem pensadas. A vida deve ser contabilizada como prioridade, inclusive na sua dimensão sensitiva e senciente, sob pena de haver a promoção de ações danosas ou mesmo irreversíveis.
Trago algumas questões que objetivam contribuir com este diálogo, na direção de repensarmos o nosso papel no planeta e as repercussões das nossas interferências na biosfera. No caso em questão, biólogos, geógrafos, por exemplo, foram consultados a respeito desta intervenção urbanística? Alternativas ao corte das amendoeiras foram apresentadas, a exemplo do transplante de árvores ou quaisquer outras? Seria este o melhor desfecho? Por fim, indago: qual é a justificativa, plausível, que engendrou tal lamentável evento?
Luciano de Almeida Lopes é Geógrafo, estuda Biogeografia, é Membro da ABbiogeo, é Sócio da SBPC e é Sócio Efetivo do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia. [email protected]*