Acessos ao Google Arts and Culture mais que dobram durante a pandemia

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Ao longo de pouco mais de 40 minutos de entrevista, o diretor do Google Arts and Culture, Amit Sood, insiste algumas vezes que ele e sua equipe não são mais do que técnicos de engenharia. “Se a escolha dos conteúdos dependesse de nós, seria um desastre”, ele diz.

Pode parecer modéstia demais para o criador de uma plataforma que, hoje, reúne milhões de obras de arte localizadas em mais de 2.000 instituições pelo mundo, 60 delas só no Brasil.

Mas, conversando com Sood, executivo criado em Mumbai e radicado em Londres, fica claro o protagonismo das instituições culturais dentro do projeto, lançado há nove anos.

Veja também: Lucro da plataforma Zoom cresce 1.123% durante pandemia

Naquele início, a iniciativa tinha basicamente duas propostas. Uma delas era permitir aos internautas percorrer os corredores dos museus sem sair de casa, a partir de uma tecnologia de geolocalização –nada muito diferente do que é feito no Google Maps.

A outra fazia com que, uma vez parados diante de uma obra, esses mesmo internautas pudessem se aproximar da tela de uma forma inviável nos museus de verdade, revelando marcas de pincel e detalhes imperceptíveis a olho nu.

De lá para cá, no entanto, o Google Arts and Culture cresceu, e muito. Em quantidade de parceiros, é claro – no começo, eles eram menos de 20. Mas, sobretudo, nos usos.

Hoje, além de explorar centenas de coleções e visitar exposições virtuais, os internautas ainda têm acesso a toda uma gama de projetos paralelos. Estes vão de descobrir obras de arte parecidas com as selfies que postam, o Art Selfie, a vídeos em que curadores realizam visitas guiadas com influencers, o Art for Two.

Isso sem falar num laboratório de experimentação que inclui pesquisas com machine learning e outras tecnologias e que conta com a colaboração de profissionais das outras áreas do Google.

A plataforma já vinha, assim, se expandindo em anos anteriores. Durante a pandemia da Covid-19, porém, ganhou ainda mais importância. Num momento em que museus e centros culturais fecharam ao público por causa das medidas de distanciamento social, a quantidade de acessos ao site e ao aplicativo mais que dobrou, segundo Sood –ele não revela números, no entanto.

O diretor credita esse crescimento todo à capacidade da plataforma de juntar num mesmo local museus e itens distantes um do outro na vida real, seja pela própria geografia ou pelas disciplinas em que estamos acostumamos a agrupá-los – moda, ?artes plásticas, ciência.”Nossas conversas iniciais foram muito complicadas. Porque tínhamos que convencer os museus a se juntar numa mesma plataforma, e mesmo no mundo real isso é difícil”, ele diz. “Mas, para nós, tudo isso é cultura.”

É essa multiplicidade, aliás, que Sood considera a maior vantagem do Google Arts and Culture. “As pessoas são obcecadas por pinturas, mas existem tantas outras formas de arte e de cultura no mundo”, ele diz. “Meu consumo pessoal de arte mudou drasticamente. Pois entendi que uma cultura não precisa de telas a óleo para ser incrível, que há mais do que a visão ocidental da arte.”

“E acho que o meio virtual pode equalizar esse meio de campo. Você pode entrar na plataforma para ver os girassóis do Van Gogh, mas acabar encontrando um trabalho indiano numa técnica completamente diferente”, exemplifica o diretor.

Questionado se esse nivelamento é observado na prática, Sood responde que a maior parte do tráfego da iniciativa ainda vem dos grandes museus europeus e americanos.Mas, ele continua, esse cenário tem mudado bastante recentemente. Usuários da Ásia e da América Latina foram os que mais cresceram nos últimos dois ou três anos. E a lista de instituições mais visitadas hoje é completamente distinta daquela do começo, com museus do Brasil e da Índia galgando cada vez posições ?mais altas no ranking.

Para esse processo ganhar força, é fundamental trazer os museus e os curadores para o debate virtual, diz Sood. “Não queremos juntá-los ali e usar algum tipo de engenharia para dizer que esses são os top cem museus. Insistimos que os curadores é que escrevam essa história.”

Ele conta que, nesses anos, uma de suas maiores descobertas foi quanto conhecimento esses curadores têm, e como eles têm medo ou não sabem como comunicar isso online.”Acho que essa crise mostrou que é do interesse deles participar dessa conversa”, afirma Sood.

“Museus precisam se sentir relevantes agora, porque mesmo nos tempos mais sombrios, continuamos a buscar maneiras de nos inspirar, de nos conectarmos uns com os outros. Basicamente, de nos educarmos.”