Agenda Bahia: Diversidade reforça o poder da tecnologia

Camila Marinho moderou debate entre Diego Figueredo, Julio Begali e Sil Bahia

A organização em redes pode funcionar como uma poderosa ferramenta de transformação. Seja quando empreendedores se conectam a tecnologias capazes de propiciar a abertura de mercados, ou quando os saberes mais antigos se juntam às novidades do mundo digital, ou ainda quando corporações consolidadas no mercado abrem suas portas para ideias de startups ainda em fase incipientes. Mas para que a tecnologia proporcione transformações positivas na sociedade, ela precisa ser aberta à diversidade. 

O desafio de adaptação à realidade após a pandemia do novo coronavírus levou a sociedade a antecipar cenários futuros e antecipar processos de transformação digital no mundo dos negócios. A utilização dos dados, que ganharam um papel central na sociedade, foi o assunto da terceira edição do Agenda Bahia ao Vivo realizada ontem, com a presença dos palestrantes Diego Figueredo, CEO da Nexo AI; Julio Begali, head da SMARTie; e Sil Bahia, codiretora executiva do Olabi e idealizadora do Pretalab. O encontro foi mediado pela jornalista Camila Marinho. 

“O conceito de rede é central em nosso trabalho. Nossa maior vocação é a de criar pontes entre mundos que parecem não estar conectados muitas vezes”, destacou Sil Bahia. Ela explicou que o Olabi é uma organização social criada em 2014 para democratizar o acesso às novas tecnologias e tentar entender o impacto que delas na sociedade. 

A organização nasceu a partir do fortalecimento da cultura maker, o faça você mesmo, em bom português. “Nós temos uma visão de que o brasileiro pode criar tecnologia, de que nós não precisamos apenas ser consumidores dela”, explicou. “Dentro deste contexto, o impacto que gostaríamos de criar é uma relação qualificada, mais crítica”, diz. 

Um exemplo do sucesso conseguido a partir da ideia de reunir técnicas hi e low tech (alta e baixa tecnologia) foi o lançamento de uma plataforma chamada Protege BR, contou. “Lançamos a ferramenta durante a pandemia e conseguimos reunir pessoas para produzir diversos equipamentos de segurança. Isso foi feito pelas pessoas, que começaram a produzir, com uma alma de Professor  Pardal”, conta. Outro caso de sucesso é o do projeto Aprenda com uma Avó, que valoriza o conhecimento que só se adquire com o tempo. 

“Uma coisa que é importante falar é que apesar de a tecnologia ser digital, mas ela não é só digital. E independente de ser digital, é sempre social porque é feita por pessoas. Tenho pensado muito em como a gente pode devolver uma certa humanidade ao desenvolvimento tecnológico, para tentar impedir um pouco os impactos negativos que  ele traz”, destaca. 

É através da diversidade que os avanços tecnológicos podem trazer proveito para toda a sociedade, ressalta Sil. Ela cita como exemplo um projeto chamado Pretalab, que atua com a missão de incluir mulheres negras no mercado de tecnologia. Através da iniciativa, 400 delas já foram incluídas. “Foi uma maneira de dar uma resposta ao  mercado de trabalho que diz não encontrar profissionais qualificadas nesta área”, conta. Atualmente existem 900 profissionais inscritas no Pretalab. 

“Neste momento pandêmico, vemos com mais clareza como a tecnologia media nossas escolhas. Isso já é presente, não é futuro. O que a gente pensa em construir já está sendo pautado agora. Já vimos como tecnologia pode reproduzir racismo e preconceito também. Nosso objetivo é que ela seja usada para mitigar as desigualdades sociais”, explica.  

Ambiente inovador 
Sem diversidade não existe inovação, acredita Julio Begali, Julio Begali, head da SMARTie. “Ter diversidade é super importante, é uma das propostas básicas de um ambiente de inovação. A gente não cria em meio ao pensamento homogêneo”, argumenta. Responsável por liderar o braço criado pelo grupo Solvi para buscar as chamadas inovações disruptivas – aquelas capazes de transformar ou até de criar mercados –, Begali é economista, com carreira no setor de telecomunicações e conheceu o universo da inovação após um período em Israel. No ano passado, foi convidado pela Solvi. 

Ele contou que a Solvi tem diversas ações inovadoras e sempre foi muito voltado para a tecnologia. Mas no final do ano passado, surgiu a ideia de olhar para fora dos muros, entender o que acontece no ecossistema e tentar trazer tudo para a empresa. No último mês de julho foi lançado o Desafio SMARTie, que começou com 150 empresas e agora chegou a sete, que estão trabalhando dentro do grupo desenvolvendo as soluções. 

“É necessário reunir prática e teoria. Isso tudo passa por uma cultura de diversidade. Tem uma série de fatores para desenvolver entre as empresas e os empreendedores”, aponta. Ele destaca o papel das empresas, mas lembra da responsabilidade do poder público no processo. “Precisa desenvolver um ambiente regulatório mais simples. Isso é importante para pequenos empreendedores. As grandes empresas têm um departamento de burocracia. A pequena empresa tem que parar de produzir para cuidar da burocracia”, compara. 

Para ele, a inovação não depende apenas da empresa e da startup. “É preciso olhar o ecossistema todo. Tem a questão da cultura empreendedora também”, explica. Ele destacou Salvador entre as cidades brasileiras que tem este ecossistema mais desenvolvido, junto com São Paulo, Recife e Florianópolis. Além de aspectos como o acesso ao capital e mão de obra, no universo da inovação, quantidade faz a diferença. “Quando tivermos a maior quantidade de pessoas diferentes trabalhando juntas, vamos conseguir resultados melhores”, acredita. 

Diego Figueredo avalia que vivemos numa época em que o conhecimento mais plural ganhou importância em relação ao especializado. “Quando mais especialista você for,  mais será a chance de sua atividade ser automatizada. Quanto mais multidisciplinar, mais difícil de automatizar”, explica. 

O Fórum Agenda Bahia 2020 é uma realização do CORREIO, com o patrocínio do Hapvida, parceria do Sebrae, apoio da Braskem, Claro, Sistema FIEB, SMARTie e SINDIMIBA e apoio institucional da Rede Bahia e da rádio GFM 90,1.

Momento nunca foi tão bom para empreender 
Para Diego Figueredo, CEO da Nexo AI, nunca houve um momento tão favorável ao empreendedorismo quanto o atual. Ele lembra que um pequeno investidor hoje conta com diversas ferramentas tecnológicas que lhe permitem focar muito mais no desenvolvimento dos negócios. “Nunca houve tantas oportunidades. Pense em um vendedor de pastel. Ele pode produzir e entregar o seu produto sem se preocupar em ter uma estrutura logística, graças aos aplicativos de entrega”, exemplifica. “Quem vai investir inclusive deve ter muita atenção para não gastar energia criando ferramentas que já existem”, recomenda. 

Figueredo acredita que o desenvolvimento tecnológico evitou que o impacto da pandemia fosse maior nas empresas. “Há cinco ou dez anos, teríamos um número muito maior de empresas quebradas”, diz. 

Para o CEO da Nexo AI, o desenvolvimento de uma cultura mais inovadora no Brasil passa por uma revisão nos processos de busca por conhecimento. “Existe um aprendizado que não se consegue nas escolas e seria muito bacana se elas passassem a oferecer. Na vida real tem erros. Quando você faz uma atividade relacionada a um produto ou processo, a cotação do dólar é fixa, mas na vida real um líder político abre a boca e a moeda sobe ou desce”, exemplifica. 

Para ele,  o conhecimento empresarial mais próximo da realidade ainda está muito restrito às empresa. “É melhor aprender engenharia na escola ou na Tesla? As empresas tem estoque de conhecimentos que muitas vezes as escolas não tem”, diz.  Ele explica que parte do trabalho Nexo AI é responder essas questões. 

Desafio com os dados será o de regular acesso 
Após revoluções nos métodos de produção agrícola, industrial e digital, o mundo vive atualmente a era pós-digital, acredita Diego Figueredo, CEO da Nexo AI. Para ele o rápido processo de desenvolvimento das vacinas contra a covid-19 é apenas uma mostra do nível de evolução do planeta. O compartilhamento de dados vai se tornar cada vez mais importante na sociedade e não apenas para o mundo de negócios. Entretanto, o uso saudável do recurso vai depender da criação de uma estrutura eficiente para  regulação, acredita o CEO da Nexo AI, Diego Figueredo.

Segundo ele, as mudanças acontecem com tamanha velocidade que os seres humanos tem até dificuldade para acompanha-las. “Se os veículos avançassem na mesma velocidade em que os chips avançaram, teríamos hoje carros custando 12 centavos, fazendo 400 mil quilômetros com litro e atingindo mais de 800 mil quilômetros por hora. O processamento avança de maneira exponencial, mas a gente só consegue enxergar de maneira linear”, explica.  

Sil Bahia acredita que é preciso levar a discussão sobre a proteção dos dados para todas as pessoas. “Eu vejo muito isso em bolhas, mas me preocupo em como chega nas outras camadas. Me preocupo em traduzir conteúdos em uma liguagem popular porque isso impacta o microempreendedor que tem uma plataforma e armazena dados ali”, lembra. Segundo ela, muitas pessoas não entendem a importância da segurança dos dados. 

Julio Begali lembra que o empreendedor de pequeno porte já tem uma série de outras preocupações e que pode acabar não tendo condições de lidar adequadamente com o desafio da gestão dos dados.