Tenet peca por preciosismos de Christopher Nolan e roteiro complexo

John David Washington

Uma boa parte dos filmes do cineasta britânico Christopher Nolan – de filmes como Amnésia, O Grande Truque e A Origem – deviam vir acompanhados de um manual de interpretação ou de um vídeo explicativo que precedesse a sessão, tamanha a engenhosidade do roteiro e a complexidade da trama. Mas deixemos claro: isso não é, necessariamente, uma virtude de um diretor de cinema. A pretensão de realizar filmes “inteligentes” muitas vezes se torna uma experiência enfadonha, hermética e cansativa para o público.

E tudo isso fica ainda pior quando são duas horas e meia de projeção. E esse é o caso do aguardado Tenet, que, com uma trama complexa e repleta de conceitos científicos, exige que o espectador tenha, no mínimo, uma iniciação no mundo da física. Não à toa, até um personagem da trama, em determinado momento, faz piada com essa complexidade.

Elizabeth Debicki e Robert Pattinson

História complexa
Vamos aqui tentar resumir a história, mas é bem provável que o esforço desse jornalista seja em vão, já que, talvez, nem o próprio Nolan, criador da trama, a tenha entendido. Mais uma vez, Hollywood explora o velho tema da viagem no tempo, embora aqui seja um pouco diferente de como ocorreu em outras ocasiões, já que desta vez se trata de inversão.

Uma entidade misteriosa  tem o poder de fazer o tempo correr ao contrário. Isso quer dizer que tudo passa a existir de trás para a frente, do futuro para o passado. Em algumas cenas, os personagens  “desatiram”. Ou seja: ao apertar o gatilho, a bala sai do alvo onde estava e volta para o cartucho de munição. 

E é claro que tinha que haver um vilão que monopoliza essa tecnologia e que está disposto a dominar o mundo e provocar uma Terceira Guerra Mundial. No caso, o vilão é o russo Andrei Sator, interpretado pelo ótimo ator Kenneth Branagh, mas que, inevitavelmente, escorrega na canastrice, tamanho o maniqueísmo do roteiro. E o vilão, claro tinha que ser um russo, o que dá uma sensação de déjà-vu que nos leva direto para os filmes dos anos 1970/80 sobre a Guerra Fria. Por falar nisso, quando Hollywood vai esquecer essa obsessão com a Rússia?

O herói, que não tem nome e é chamado apenas de O Protagonista, é interpretado por John David Washington, de Infiltrado no Klan. É ele, um agente da CIA, que vai tentar acabar com os planos de Sator. Para isso, terá a ajuda de Neil (Robert Pattinson). E como estamos falando de um filme de espionagem, não poderia deixar de ter uma mulher para fazer as vezes de bondgirl: Elizabeth Debicki, que vive Kat.

“Tenet é uma história clássica de espionagem, cresci adorando filmes de espionagem. Mas para tocar o público de hoje, para que eu realmente me envolvesse, eu queria que ele tivesse maiores possibilidades”, diz Nolan em material de divulgação.

O problema, talvez, é que essas “possibilidades” a que o diretor se refere talvez tenham se estendido demais: Tenet mistura elementos da ficção científica com espionagem, adiciona clichês dos filmes de ação e ainda tenta fazer comédia em alguns momentos. Mas as piadas não convencem e aparecem em momentos absolutamente inoportunos, como tem acontecido em muitos filmes de super-heróis. Só servem mesmo para quebrar o clima.

Kenneth Branagh

E as cenas de ação, que tal? Elas até que são boas, mas, convenhamos, isso não é lá grande virtude hoje em dia. As cenas de luta, a despeito de usarem bons coreógrafos, também não fogem do lugar-comum: a câmera não para quieta enquanto os personagens se atracam e o espectador fica tonto com tanto movimento. Em resumo: se quer boas lutas e perseguições, fique com filmes de ação raiz, como Velozes & Furiosos, que faz isso sem um roteiro pretensioso. E se  quer filmes de espionagem, recorra ao velho James Bond. 

Cotação: bom