Sem data para carnaval de 2021, blocos e camarotes de Salvador vendem 10% dos abadás

Assim que acaba o carnaval, na quarta-feira de cinzas, é costume blocos e camarotes de Salvador começarem as vendas para a folia do ano seguinte. Entre fevereiro e abril, cerca de 30% dos abadás já estavam vendidos na Central do Carnaval, empresa que detém quase metade da comercialização dos produtos da festa. Neste ano, o cenário é bem diferente por conta da pandemia do novo coronavírus: agências venderam menos de 10% dos abadás para o carnaval de Salvador de 2021, uma festa que ainda não tem data para acontecer. A maioria dos blocos nem abriu para comercialização (veja lista abaixo).
Em meio à indefinição, empresas flexibilizaram a política de vendas para o folião que tinha adquirido o abadá. Ele pode ficar com um crédito para 2022 ou para um nova data que surja no próximo ano, se houver adiamento, ou ter a devolução integral do dinheiro se a festa for cancelada. No caso do potiguar Diogo Bezerra, 27 anos, ele preferiu deixar como crédito para 2022. Ele já tinha comprado três abadás para o carnaval do ano que vem antes da pandemia se agravar, para os blocos das cantoras Claudia Leitte e Alinne Rosa. São sete anos seguidos que ele passa o carnaval em Salvador com os amigos, grupo que pula todos os dias e se programa com bastante antecedência para se beneficiar das promoções.
“Essa situação pegou todo mundo de surpresa, já tinha comprado três dias. Continuei pagando porque vou usar no futuro. Carnaval não dá para deixar de ir, quem vai, vicia. Então a gente colocou na cabeça que não iria em 2021 porque está muito em cima, não vai dar para todo mundo ter a vacina, mas estamos programando 2022”, contou Bezerra, que hoje mora em São Paulo.
O soteropolitano Rodrigo Estrela também não acredita em carnaval sem vacina. Desde 2012, ele marca presença todos os anos, e, na edição do ano passado, conheceu a noiva, Ana Beatriz, na folia. “Acho muito perigoso um carnaval com a estrutura do de Salvador ser realizado sem uma vacina”, avaliou Estrela, que é professor na Universidade Federal do Sudoeste da Bahia (UFOB). Ele não acha boa ideia a festa ser adiada para o segundo semestre. “Se tiver em junho ou julho, pode competir com o São João, fora que não tem graça, não tem a cara de Salvador. Carnaval tem que ser no verão, nas férias. Já ouvi também muita gente falar que não vai por não ter folga em julho no ano que vem”, comentou o professor.
Cancelamentos e vendas em baixa
O bloco Me Abraça já anunciou que não comparecerá ao desfile de fevereiro do ano que vem, que havia sido programado para 14 e 15 de fevereiro. “Existe a pandemia e a gente tem que ser responsável. Normalmente a gente sempre lançava as vendas em maio, junho. O público estava cobrando e a gente tinha que dar uma satisfação”, explicou um dos diretores do bloco Me Abraça, Ricardo Lelys.
Um dos blocos mais tradicionais da capital baiana, o Afoxé Filhos de Gandhy manteve as vendas, mas não lucrou nem 10% do que costuma. Segundo o presidente do bloco, Gilsoney de Oliveira, a entidade vai esperar um posicionamento da prefeitura para definir a ausência ou não do carnaval de 2021. “As vendas caíram mais de 98%, como todos os outros. Mas gente não suspendeu porque existe a possibilidade de acontecer em julho ou agosto de 2021. Se tiver, iremos participar”, contou. Segundo ele, são mais de quatro mil associados.
No caso dos camarotes, somente o Premier e o Camarote Salvador lançaram vendas para este ano. Um dos sócios do camarote Nana, o empresário Fred Boat, lamenta o prejuízo do segmento e entende a vacina como necessária para a realização do carnaval. “Não contratei nada, não me comprometi com despesas, mas também não tenho receita. Em outubro, praticamente todos os camarotes já têm tudo contratado, atrações e artistas anunciados, restaurantes, estrutura, iluminação, cenografia… e boa parte delas paga”, contou o empresário. Segundo ele, cerca de 30 a 40% dos abadás estariam vendidos nesta época do ano, se não fosse a pandemia.
O diretor da Central do Carnaval, o empresário Joaquim Nery, disse que a partir do momento que surgiu a pandemia, suspendeu a divulgação das vendas dos blocos e camarotes no site, mas as vendas continuaram porque havia demanda. “Lançamos as vendas na quarta de cinzas como fazemos todos os anos, que tem uma série de vantagens de descontos e prazos. A partir do momento que chegou a pandemia, suspendemos a divulgação, mas mantivemos o site aberto porque havia uma forte demanda para compra, as pessoas não entendiam que não teria carnaval em fevereiro”, explicou o empresário. Novas regras também foram criadas para que o cliente que já adquiriu o abadá opte pela devolução ou gere o crédito com a empresa.
Como o carnaval depende da autorização pública para acontecer, Nery aguarda uma decisão da prefeitura e espera que seja adiado para uma nova data. Contudo, o empresário acredita que comemorações espontâneas surjam em alguns bairros em fevereiro. “Tenho a impressão que vai existir um carnaval informal, coisas espontâneas em alguns bairros que não vai ter como controlar, de tão grande que é a vontade das pessoas.
Outras agências que vendem produtos para o carnaval também estão sem muito movimento nas vendas. O sócio-diretor do Folia Bahia Rodrigo Magalhães disse que nem 10 unidades chegaram a ser vendidas. As vendas no site se iniciaram em abril. “O mercado de venda de abadás para 2021 está praticamento parado. Vai começar a movimentar depois da definição da data, pois existe a possibilidade de um adiamento”, comentou Magalhães. No caso do Quero Abadá, a situação é parecida. “Os blocos, camarotes, o empresariado e o folião estão aguardando uma definição do poder públuco e isso em impactado diretamente nas vendas. Temos pouquíssuimos poucos em relaçao ao ano passado”, relata o diretor do Quero Abadá, Vitor Hugo. Segundo ele, houve queda de 70% nas vendas.
Sem data definida
A maioria dos empresários do setor ouvidos pela reportagem aguarda uma decisão do prefeito ACM Neto sobre o tema para tomar uma decisão. Segundo o presidente da Empresa Salvador Turismo (Saltur), Isaac Edington, o anúncio deve ser feito em novembro. “O prefeito ainda não formalizou o cancelamento, mas tudo aponta que dificilmente será em fevereiro, porque não há indicativo que uma vacinação em massa seja feita até lá. A tendência é o adiamento para uma nova data no segundo semestre, mas tudo depende das condições sanitárias”, adiantou o presidente. Edington também disse que Neto conversa com prefeitos de outras capitais brasileiras para combinar uma data em comum para o carnaval.
O presidente do O Conselho Municipal do Carnaval e Outras Festas Populares (Comcar), Pedro Costa, disse que se o carnaval for realizado sem vacina, corre risco de a Bahia sofrer uma segundo onda da pandemia da covid-19, como está havendo agora na Europa. “Não dá para fazer uma festa e botar um milhão de pessoas sem esperar a vacina. Por questões de saúde, não tem como fazer, não tem segurança. Temos que ter cuidado para não deixar que o que está acontecendo na Europa ocorra aqui, que relaxou no controle e a segunda leva do coronavírus está vindo forte”, preveniu o presidente.
Orientações do Procon-BA
A Superintendência de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon-BA), vinculado à Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social, orienta aos consumidores de bloco ou camarote a terem atenção ao contrato da compra e aos avisos das entidades carnavalescas ou produtoras do evento. Por meio de nota, o Procon-BA informou que valem os efeitos da Lei nº 14.046, de 24 de agosto de 2020, que dispôs sobre o adiamento e o cancelamento de serviços, de reservas e de eventos dos setores de turismo e de cultura em razão do estado de calamidade pública reconhecido.
Além disso, orientação do Procon é para a conciliação das partes, afim de que não haja uma maior oneração ao consumidor. As alternativas são: promover o adiamento para a data da efetiva realização dos festejos de carnaval; obter o valor em créditos para nova compra de outro produto da mesma produtora; ofertas negociadas com aceitação expressa do consumidor; e promover a devolução do valor, caso não haja alternativa de conciliação.
Blocos que iniciaram vendas
Largadinho
Eva
Vumbora
Nana
Camaleão
Filhos de Gandhy
Camarotes que iniciaram vendas
Camarote Salvador
Camarote Premier
Blocos que não iniciaram vendas
Coruja
Timbalada
Fissura
Praieiro
Me Abraça
Crocodilo
Cheiro de Amor
Pinguço
Inter
Vumbora day
Voa Voa
DD no comando
Sollares
*Sob orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro