Supermercados não são ‘vilões’ na alta do arroz, diz associação após reunião com Bolsonaro
João Sanzovo Neto diz que problema está relacionado a maior demanda e menor oferta. Governo cobrou explicação de comércio e produtores; arroz já subiu 19,2% desde janeiro. O presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), João Sanzovo Neto, afirmou nesta quarta-feira (9) que os comerciantes não são os “vilões” no aumento dos preços dos alimentos da cesta básica – incluindo o arroz e o óleo de soja, principais afetados no último mês.
Neto se reuniu nesta quarta com o presidente Jair Bolsonaro, em Brasília, para tratar do assunto. Desde a última quinta (3), Bolsonaro vem fazendo apelos públicos para que os donos de supermercados reduzam margens de lucro e abaixem os preços “por patriotismo”.
“Nós explicamos ao presidente que já estamos fazendo isso [cortando o lucro]. Nós sempre fizemos, na cesta básica, porque o setor é muito competitivo. A gente não repassa de vez nossos aumentos […] Não vamos ser vilões de uma coisa que não somos responsáveis”, afirmou Neto.
Nesta quarta, o Ministério da Justiça pediu explicações sobre os preços a produtores e à Abras (veja detalhes abaixo).
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Após a reunião, Neto disse que não saberia informar um prazo para que a redução dos preços chegue às gôndolas, mesmo que alguma medida imediata seja tomada. Segundo ele, o problema está ligado ao excesso de demanda e à falta de oferta.
Na prática, isso significa que falta produto e, por isso, o preço aumenta.
“Eu não sei responder [se há prazo]. Pode ser que seja mais rápido. Tem um lado psicológico que pode ser que afete aí, o fato de consumir mais macarrão [talvez] já faça uma regulagem do preço. O que precisa, sim, é entrar mais produto. Ter mais oferta do arroz no mercado para resolver esse problema”, declarou.
Inflação no supermercado
O preço dos alimentos foi destaque para a alta de 0,24% da inflação oficial do país em agosto, segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nesta quarta.
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O Índice de Preços para o Consumidor Amplo (IPCA) subiu 2,44% em 12 meses, enquanto a inflação dos alimentos subiu 8,83% no período.
Essa alta não tem apenas um alimento responsável porque a maioria está com preços recordes no campo. Porém, dois chamaram a atenção nos últimos dias: o arroz, com valorização de 19,2% no ano, e o óleo de soja, que subiu 18,6% no período.
Entre os itens que mais subiram em agosto, estão tomate (12,98%), óleo de soja (9,48%), leite longa vida (4,84%), frutas (3,37%), carnes (3,33%) e arroz (3,08%).
“O arroz acumula alta de 19,25% no ano, e o feijão, dependendo do tipo e da região, já tem inflação acima dos 30%. O feijão preto, muito consumido no Rio de Janeiro, acumula alta de 28,92% no ano, e o feijão carioca, de 12,12%”, destacou o gerente da pesquisa, Pedro Kislanov.
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Múltiplos fatores
Em nota divulgada na última quinta-feira (3), a Associação Brasileira de Supermercados afirmou que o setor tem sofrido forte pressão de aumento nos preços, de forma generalizada, repassados pelas indústrias e fornecedores.
Segundo a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), a pandemia fez os brasileiros comprarem mais alimentos, o que forçou preços para cima antes mesmo das altas provocadas pela entressafras.
Além disso, a disparada do dólar em relação ao real encareceu os insumos da agropecuária.
“Com o câmbio mais elevado, o fertilizante está mais caro. O farelo de soja e de milho que é utilizado na ração de animais tem regiões com mais de 50% de aumento de custos de produção”, explicou Bruno Lucchi, superintendente-técnico da CNA.
O Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socieconômicos (Dieese) afirma que o dólar alto também estimula os produtores a vender para os outros países.
“Quando se exporta um produto, você manda para fora, o produtor recebe em dólar, e na hora em que ele transforma em real ele ganha mais. Então, uma taxa de câmbio desvalorizada, estimula a exportação. Você tem um impacto muito grande das exportações no volume de produtos ofertados no mercado interno. Quando eles [os produtos] chegam em menor quantidade, [há] uma redução da oferta interna e eles chegam mais caros para as famílias”, explica a economista sênior do Dieese Patrícia Costa.