Dúvida na hora de acionar a garantia do carro? Conheça seus direitos
Dor de cabeça por causa de alguma compra e gastos inesperados são duas das coisas que ninguém quer por perto, principalmente no meio de uma pandemia, não é mesmo? E se você comprou um carro com garantia, saiba que você tem uma série de direitos que vão desde reparos em ponto de ferrugem até trocas de lâmpadas de farol, câmbio e motor. Tudo isso sem gastar um tostão a mais.
Antes de qualquer coisa é importante discernir que existem dois tipos da garantia segundo o Código de Defesa do Consumidor. Uma é assegurada por lei e a outra trata-se de um contrato, algo semelhante àqueles de garantia estendida que são oferecidos para celulares e eletrodomésticos.
Diretor de Fiscalização do Procon-BA, Iratan Vilas Boas contou ao CORREIO que a garantia assegurada por lei, chamada de garantia legal, tem validade de 90 dias no caso dos carros e não necessita de nenhum documento comprobatório além daquele que mostra que o consumidor adquiriu o veículo na concessionária. Essa garantia cobre, durante esse período, quaisquer defeitos de fabricação ou semelhantes que o carro venha a ter. Isso, claro, desde que o comprador não tenha feito mau uso do veículo.
“É bom ressaltar que a garantia legal vale para todo o tipo de veículo. Não importa se usado, novo ou vindo de promoções ou saldões. Todo produto tem assegurado por lei esse direito de uma garantia legal, que no caso dos automóveis é de 90 dias”, conta Iratan.
Só que para atrair mais consumidores, muitos fabricantes e concessionárias oferecem uma outra cobertura: é a garantia contratual. Você, leitor, com certeza já viu anúncios de lojas oferecendo garantia de 1, 3 ou 5 anos – esta última oferta, por exemplo, é possível de conseguir na CAOA Chery D21 Motors Paralela. Novo lançamento da concessionária, o Tiggo 8 tem 5 anos de garantia e sai com o preço promocional de R$ 156.900.
Iratan Vilas Boas explica que essa proteção oferecida pela garantia contratual não é absoluta e por isso o consumidor precisa ficar atento para uma série de detalhes importantes que, caso descumpridos, podem até provocar o cancelamento desse contrato.
“É importante que essas restrições fiquem claras e venham em termos ostensivos no certificado de garantia. A lei diz que as cláusulas restritivas de direito devem ter destaques nos contratos. É importante o consumidor ficar atento a isso para não pensar que a garantia faz uma cobertura completa quando ela pode, por exemplo, ser restrita a motor e câmbio”, explica Iratan.
Também especialista em direito do consumidor, o advogado Natã Macedo explica que as montadoras têm o direito de impor exceções na garantia e também estão isentas de cobrir despesas que acontecem por desgastes naturais. Alguns exemplos: pastilhas de freio, cabos e velas, filtro de ar e combustível.
“A grande dica é procurar a montadora o quanto antes. Logo que o problema aparecer, corra para resolver. Isso evita que surjam alegações de desgaste natural e também há risco do problema se agravar e provocar outros defeitos”, diz Natã.
Mário Santana é morador de Piatã, em frente à orla, e tinha uma grande preocupação em relação aos prováveis pontos de ferrugem que poderiam surgir no carro por conta do salitre. Gerente de pós-venda da Indiana Ford, Antônio Roque dos Reis explica que a garantia da Ford cobre qualquer tipo de oxidação por defeito de fabricação ou deficiência do material. O padrão da Ford é oferecer 2 anos e 9 meses de garantia contratual.
“A garantia só não cobre o reparo caso seja decorrente de alguma avaria prévia ou se o veículo sofrer uma colisão e for reparado fora da rede de concessionária Ford”, explica Reis.
A Ford oferece garantia de três anos, com algumas especificações. Os amortecedores têm cobertura de até 2 anos ou 60 mil km rodados com o veículo. E, para carros de modelos a partir de 2021, a bateria só tem cobertura de 12 meses. A exceção é a Ranger, única picape da montadora, que tem 4 anos e 9 meses de garantia com as mesmas restrições.
De acordo com Reis, os itens que são mais comuns de serem trocados pela garantia são componentes da parte elétrica. Bombas de combustível também são trocadas com frequência, decorrente de avarias com combustível ruim.
E mesmo os itens de desgaste natural podem ser substituídos pela garantia desde que a avaliação da montadora ateste que não houve um problema natural, senão algum problema de fábrica.
Ranger tem 4 anos e 9 meses de garantia da montadora (Foto: Divulgação) |
Exigências
Por se tratar de uma espécie de cortesia ou benefício extra oferecido pelas montadoras, não há nenhuma cobertura que seja obrigatória para a garantia legal. E é importante ficar atento às condições que mantém o contrato válido.
Uma das exigências mais comuns para que a empresa honre com os benefícios da garantia contratual é a realização de todas as revisões previstas no plano de manutenção do veículo, que fica disponível no manual do carro e varia de acordo com cada modelo.
Essas revisões preveem a análise e substituição de vários componentes dentro de determinados períodos e ajudam a prolongar a vida útil do automóvel – traduzindo: redução de danos para evitar problemas.
O advogado alerta um problema: as concessionárias autorizadas costumam praticar preços muito elevados em relação ao mercado para a realização das manutenções. E aí o consumidor ou deixa de fazer as revisões obrigatórias ou procuram outros locais para fazê-las sem onerar tanto o bolso. E isso pode dar margem ao cancelamento da garantia.
“Há casos em que podemos considerar um abuso de direito da montadora. O fato é que a exclusão da garantia depende de uma relação que chamamos de causa e efeito. Se conseguirem comprovar que a falta de revisão teve como efeito aquele dano, aí há margem para o cancelamento. Mas a empresa precisa comprovar que o problema em questão teria sido evitado se o carro estivesse em dia com a revisão”, explica Natã Macedo.
No entanto, em caso de serviços feitos fora da rede autorizada, a concessionária tem todo o respaldo para cancelamento já que não pode assumir as consequências de manutenções malfeitas que as empresas sequer fizeram.
Vício oculto
Ainda há casos em que existe o direito a reparos mesmo após a garantia expirar. Iratan Vilas Boas explica que isso está previsto no Parágrafo 3 do Artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor e é chamado de vício oculto.
Um caso prático e famoso do que é esse vício oculto aconteceu em 2008. Uma série de proprietários do Volkswagen Fox fabricados a partir de 2003 teve seus dedos decepados durante com o rebatimento dos bancos traseiros do veículo. A empresa precisou fazer um recall de mais de 477 mil veículos vendidos no Brasil e pagou uma série de indenizações.
Em resumo: mesmo que um desses veículos estivesse fora da garantia, os proprietários têm direito ao reparo gratuito desse dano. No entanto, há casos sem o apelo midiático como esse do Fox. Aí o consumidor precisará entrar na Justiça para comprovar que há um problema.