Salvador tem segundo domingo com mais veículos nas ruas desde o começo da pandemia

Enquanto os casos confirmados e o número de óbitos pela covid-19 crescem – são 1.145 mortos e 37.620 infectados na Bahia, segundo dados desta segunda-feira, 15, da Secretária de Saúde do Estado (Sesab) – a taxa de circulação de veículos em Salvador não reduz. Dados de um levantamento da Transalvador obtidos pelo CORREIO revelam que o fluxo de veículos na cidade tem aumentado e que o último dia 14 foi o segundo pior domingo desde o início da pandemia, com 73% dos motoristas da cidade na ruas.
A taxa de isolamento social do estado também está abaixo do recomendado pelas autoridades de saúde, em 47,2%, segundo a plataforma Inloco, disponibilizada pela Secretaria de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI) para acompanhar a movimentação das pessoas, usando dados da rede de telefonia celular.
O estudo da Transalvador mostra que apenas 23% dos veículos que circulam normalmente na cidade ficaram em casa no último domingo. No transporte público, 33% dos passageiros usaram o serviço. Segundo a Prefeitura, esse percentual vem se mantendo estável nas últimas semanas
Desde o dia 01 de maio, quando apenas 36% dos veículos estavam em circulação (foi o segundo melhor índice desde o início da pandemia), o fluxo de automóveis não conseguiu se manter abaixo da marca de 45%. Ou seja, mais da metade dos automóveis está nas ruas, todos os dias.
Se fizermos ainda uma comparação entre 18 de março – um dia após os decretos da prefeitura com as medidas de isolamento social – e o dia 14 de junho, houve aumento de 8,8% no fluxo mensal de veículos transitando pela cidade.
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Principais avenidas de Salvador estão com fluxo de veículos próximo ao normal pré-pandemia (Foto: Marina Silva/CORREIO) |
Taxa de circulação
Em junho, até agora, o maior índice de circulação foi de 84%, na quarta-feira, 10, um dos piores já registrados. Nesse dia só 16% dos motoristas ficaram em casa. O melhor indicador até agora do mês foi no dia 6, quando 59% da frota circulou. Já no mês de abril, a taxa de circulação atingiu 32% no dia 21, o melhor resultado desde o começo dos decretos municipais. Ou seja, na referida data, a estimativa era de que 657.291 veículos saíssem às ruas, mas, 211.006 de fato circularam, cerca de dois terços dos automóveis ficaram na garagem.
A taxa é calculada através de uma comparação com a média de fluxo de trânsito normal na cidade (quando não há interferência de festas, feriados ou datas comemorativas). A Transalvador explica que usou como referência o mês de setembro do ano passado. O órgão ressalta ainda que o índice não é calculado em relação ao número total de veículos emplacados em Salvador, e sim com a média dos que costumam circular pelas ruas. Segundo o Detran, existem hoje 1.013.570 veículos registrados no município.
Fabrizzio Muller, superintendente da Transalvador, acredita que o motivo das pessoas não ficarem em casa é por conta do longo período da quarentena. “É uma tendência natural, com o longo tempo de restrições, as pessoas acabam desobedecendo e relaxando nas orientações de permanecerem em casa”, supõe o superintendente. Porém, ele reforça que o isolamento é necessário: “Os números mostram a necessidade de ficar em casa”, completou.
Ele afirma ainda que o número desejado de circulação de veículos em Salvador deveria se manter em 40%, o que só foi atingido uma vez neste mês de junho. Além disso, Muller disse que o esforço deve ser coletivo. “Quanto mais se colaborar, mais rápido sairemos dessa situação”, pediu o superintendente.
O motorista Jordan Neves**, 23, que roda Uber desde o final de janeiro deste ano, confirma que tem notado um aumento na circulação nas ruas desde o final de maio, quando comparado aos meses de março e abril. “Tá praticamente voltando ao normal, parece que o povo não tá mais de quarentena”, comentou. O número de corridas também cresceu: no início da pandemia, Jordan** disse que fazia em torno de 7 a 10 corridas por dia e que, agora, o normal é de 12 a 15. Os bairros que mais tinham aglomeração, segundo ele, eram os de Cajazeiras, Mata Escura e Sussuarana. Além disso, ele relata que a avenida ACM “só anda engarrafada”.
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Avenida Tancredo Neves na manhã de ontem (Foto: Marina Silva/CORREIO) |
Díficil, mas necessário
A infectologista Ceuci Nunes, diretora do Hospital Couto Maia – referência estadual no tratamento de doenças infecciosas – entende que é difícil fazer o isolamento social, mas que é uma medida necessária quando ainda não há vacina contra o vírus. “É difícil manter o isolamento, não só por questão econômica, mas porque o brasileiro é um povo que gosta muito de festa. Mas sair de casa dessa maneira é colocar a perder tudo que temos feito nesses últimos três meses”, alertou a médica.
Dra. Ceuci orienta que somente o uso da máscara não é o suficiente, pois é preciso também manter a distância de 1,5m entre as pessoas. “Não é só porque você está de máscara que vai ficar próximo da pessoa, mesmo ao ar livre”, ressaltou. A infectologista argumentou ainda que a taxa de transmissão da covid-’19 em Salvador, que agora está em 1,8%, deveria estar abaixo de 1%, e que o índice de isolamento social, que agora está em 47,2%, deveria estar, num cenário ideal, em 60%, ou no mínimo, em 50%. Só depois de atingir essas metas, junto à diminuição do número de casos por um período de 14 dias, é que as atividades normais deveriam retornar.
Mas alguns teimosos insistem em sair de casa e se aglomerar. Um vídeo que circulou nas redes sociais mostrou que muitos soteropolitanos aproveitaram o final de tarde do último domingo para uma caminhada no Farol da Barra, o que gerou aglomeração. A Sedur (Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo) tem recebido inúmeras denúncias de locais que, assim como os transeuntes da Barra, não querem abandonar a normalidade.
Com apoio da Guarda Municipal e da Polícia Militar, a Sedur interditou, só neste domingo, 14 estabelecimentos. Ao todo, foram realizadas 646 vistorias distribuídas em 29 bairros de Salvador. Desde o dia 18 de março, foram feitas 43.598 vistorias, as quais interditaram 3.012 locais de comércio e cassaram o alvará de funcionamento de 91 deles.
Ao CORREIO, o secretário de Saúde de Salvador, Léo Prates, fez um alerta: “Nos últimos dias, nós vimos um crescimento da ocupação dos leitos de UTI e esse é o dado mais importante para nós. A importância de ficar em casa é diminuir o número de doentes ao mesmo tempo em Salvador. Ou seja, a demanda por leitos clínicos e de UTI. Por isso, para o sistema de saúde não colapsar, precisamos da ajuda das pessoas, precisamos que eleas fiquem em casa”.
Atualmente, a capital baiana tem ocupação de 87,6% dos leitos de UTI para pacientes com covid-19 e 75,2% dos leitos de enfermaria, segundo levantamento da SMS.
FLUXO DE VEÍCULOS EM SALVADOR:
*Datas com mais carros nas ruas:
17 de março – 99%
18 de março – 93%
19 de março – 85%
16 de abril – 88%
7 de maio – 86%
16 de maio – 93%
18 de maio – 88%
1 de junho – 83%
10 de junho – 84%
*Pior domingo com mais carros nas ruas:
17 de maio – 81%
*Dias com menos carros nas ruas:
22 de março – 38%
21 de abril – 32%
01 de maio – 36%
*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro
**O sobrenome foi alterado para preservar a identidade da fonte