MP que permite a Weintraub escolher reitores temporários durante a pandemia pode atingir 19 universidades e institutos federais em 2020


Outros 4 institutos federais de ensino têm reitores com mandatos que vencem neste ano. Texto foi publicado no ‘Diário Oficial’ após MP anterior sobre escolha de reitores perder validade há uma semana. Aluno no campus Gama da Universidade de Brasília; mandato da atual reitora vence em novembro deste ano.
Edu Lauton/Secom UnB
A medida provisória que permite ao ministro da Educação, Abraham Weintraub, nomear reitores durante a pandemia do coronavírus poderá atingir 15 universidades e 4 institutos federais de ensino, que têm dirigentes com mandatos que vencem neste ano, de acordo com a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes).
A MP foi publicada nesta quarta-feira (10) pelo presidente Jair Bolsonaro e já está em vigor.
A Andifes informou que vai contestar a medida, por ferir a autonomia universitária. O Conif, conselho que representa os reitores de institutos federais, afirmou que está articulando com partidos políticos uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a inconstitucionalidade da medida. Para a União Nacional dos Estudantes (UNE), o objetivo da medida é “manipular esses resultados a favor de um alinhamento ideológico com o governo” (leia as íntegras das notas abaixo).
A nova regra surge uma semana após outra medida provisória, sobre o mesmo tema, perder a validade por não ter sido votada no Congresso. Esta medida foi publicada no final de dezembro e também alterava as regras para a escolha de reitores e pró-reitores de universidades e institutos federais de ensino, estabelecendo pesos diferentes nos votos de professores, alunos e funcionários.
Em 2019, o governo interveio na nomeação de ao menos 6 reitores, entre as 12 nomeações que haviam sido feitas até agosto daquele ano.
Weintraub x Universidades
Abraham Weintraub em audiência na Câmara em dezembro, para explicar declarações polêmicas sobre plantações de maconha em universidades federais
LUIS FORTES/MEC via BBC
Agora, Weintraub poderá escolher o reitor de universidades em que houve atritos anteriores, como a Universidade de Brasília (UnB). O mandato da reitora Marcia Abrahão Moura vence em 23 de novembro deste ano. Um estudo publicado no ano passado mostrou que a UnB está entre as 300 melhores do mundo na área de ciências médicas.
Em abril de 2019, o Ministério da Educação (MEC) anunciou o corte de verbas de custeio e investimentos de três Universidade Federais. A Universidade Federal Fluminense (UFF), a Federal da Bahia (UFBA) e a Universidade de Brasília (UnB) foram as primeiras a terem o orçamento para essas despesas não obrigatórias bloqueado em 30%.
Na época, em entrevista ao ‘Estado de S.Paulo’, Weintraub disse que a “balbúrdia” poderia levar a cortes. A afirmação gerou críticas. Ao fim do dia, o MEC informou que o corte no orçamento iria se estender a todas as instituições.
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Em dezembro, Weintraub foi convocado a depor na Comissão de Educação da Câmara para esclarecer afirmações contra as universidades federais. Weintraub havia declarado que as universidades são “madraças de doutrinação” e “têm plantações extensivas” de maconha, além de os laboratórios de química estarem desenvolvendo droga sintética, a metanfetamina.
Aos deputados, ele reafirmou a existência de plantações de maconha e laboratórios de produção de drogas nas universidades federais. Para embasar a fala, o ministro exibiu uma série de reportagens sobre o tema – os casos, entretanto, não tinham relação com as universidades. Um levantamento feito pelo G1 apontou que nenhum processo foi aberto contra os reitores das instituições.
Instituições com mandatos de reitores que vencem em 2020
De acordo com um levantamento da Andifes, com a medida, Weintraub poderá nomear 15 reitores de universidades federais, com mandatos que vencem neste ano:
Setembro
Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA)
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
Outubro
Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA)
Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR)
Universidade Federal do Pará (UFPA)
Novembro
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS)
Universidade Federal do Piauí (UFPI)
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)
Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
Universidade Federal de Rondônia (UNIR)
Universidade de Brasília (UnB)
Universidade Federal de Sergipe (UFS)
Dezembro
Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI)
Universidade Federal do Paraná (UFPR)
Universidade Federal de Uberlândia (UFU)
Além destas universidades, o Conif informou que outras quatro instituições federais de ensino também poderão ser afetadas:
Setembro: Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (IFMA)
Outubro: Instituto Federal de Roraima (IFRR)
Outubro: Instituto Federal do Norte de Minas Gerais (IFNMG)
Novembro: Instituto Federal Farroupilha (IFFar)
Íntegra das notas
Andifes
“A Andifes, com a urgência que o tema requer, está tomando as providências cabíveis, mantendo contato com parlamentares, juristas e entidades, para coordenar as ações pertinentes à contestação dessa MP, que atenta de forma absurda contra a democracia em nosso país e a autonomia constitucional de nossas universidades” – reitor João Carlos, presidente da Andifes.
Conif
“O Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif) rejeita o conteúdo da Medida Provisória nº 979, publicada hoje de manhã na D.O.U, por se tratar de uma ofensa ao princípio constitucional que garante a autonomia universitária, inclusive para a escolha de seus dirigentes. Especificamente para os Institutos Federais e para o Colégio Pedro II, o dispositivo desrespeita, ainda, a sua Lei de Criação (Lei nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008), que garante a consulta à comunidade acadêmica e as eleições democráticas no âmbito da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica.”
UNE
“Bolsonaro e Weintraub já haviam editado uma Medida Provisória em pleno Natal do ano passado, que alterava o método de eleição e nomeação de reitores nas Universidades e Institutos Federais, com um evidente objetivo de manipular esses resultados a favor de um alinhamento ideológico com o governo. Projeto esse que foi absolutamente ignorado pelo Congresso Nacional, o que significa uma mensagem de que tal tema não importa à democracia.
Mas o descaramento autoritário e a sede de controle ideológico do Governo Federal, que tornou o MEC em uma mera ferramenta de sua guerra cultural, alcançaram níveis estratosféricos. Soma-se a isso a insensibilidade e a desumanidade de quem se aproveita de um momento de grave crise sanitária, com dezenas de milhares de brasileiros mortos, para aplicar o golpe na surdina, ou, como um de seus próprios ministros afirmou, “passar a boiada”.
Mesmo diante de todas as dificuldades, as instituições federais de ensino superior (IFES) tem sido exemplares no combate ao CoronaVírus, seja através dos Hospitais Universitários ou na produção de máscaras, álcool gel, respiradores e outras ações importantes. Nesse momento nossas instituições demandam maiores contingentes de investimento, sobretudo no que tange à assistência e permanência estudantil, e não há um projeto sequer coordenado pelo MEC para buscar reduzir os impactos da pandemia no acompanhamento das atividades acadêmicas pelos estudantes.
A MP 979/2020 é uma afronta às universidades e institutos federais brasileiros, é um ataque à democracia e à autonomia dessas instituições, além de ser flagrantemente inconstitucional. A indicação de reitores “pro-tempore” durante o período da pandemia serve exclusivamente ao interesse do MEC de impor interventores que sirvam à cartilha do governo. Aproveitam da crise sanitária para impedir que as universidades e institutos federais façam suas próprias eleições.” – Iago Montalvão, presidente da UNE